
Inevitável começar este texto sem cair no clichê de que 2019 está nos reservando partidas irreparáveis. Ainda em luto pela ida de João Gilberto, o Brasil amanheceu esta quarta-feira, 10 de julho, com a notícia da morte de Paulo Henrique Amorim, 77 anos. Sua formação acadêmica é no campo das Ciências Sociais, mas a atuação profissional deu-se no jornalismo. Integrou, com destaque, redações de revistas como Realidade, Veja e Exame, nos anos 1970; depois Jornal do Brasil.
O faro de repórter credenciou-lhe a migrar para o vídeo – TV Globo, Manchete, Band. Com o advento da internet, levou sua competência para Uol, Ig; depois criou seu próprio espaço, o Conversa Afiada. Em todos esses veículos, estabeleceu um estilo próprio de linguagem, ímpar, que se tornou referência – especialmente na construção de seu Conversa Afiada. Orações diretas, objetivas, mas temperadas com figuras de linguagens e remissões a links, hoje características inerentes a blogs e espaços similares na internet, já eram marcas das postagens de Paulo Henrique Amorim lá atrás.

Mas aqui em Intertelas, o que merece destaque particular é o Paulo Henrique Amorim como profissional do audiovisual. Em paralelo ao seu projeto independente, o blog Conversa Afiada, o jornalista estava na Rede Record desde 2003. O seu “Olá!, tudo bem?”, saudação na abertura do programa do qual foi âncora, o Domingo Espetacular, era reconhecido por telespectadores de todas as gerações. Tinha sido assim na Globo, na Manchete, na Band: Paulo Henrique Amorim notabilizou-se por relatar e comentar notícias, das mais áridas da política e economia, com objetividade, simplicidade – com uma postura na tela que tornava a audiência uma interlocutora, não apenas mera espectadora. Uma coloquialidade e senso de humor na medida – bem diferente das firulas que vemos hoje nos telejornais.

Desde o fim do mês, Paulo Henrique Amorim estava afastado do Domingo Espetacular. Continuava contratado da Record, todavia sem função. Pouco explanou sobre o afastamento, no entanto há fortes indícios de que a postura crítica ao poder econômico e político que tem ditado os rumos do Brasil era a causa da geladeira a que foi submetido. As ligações entre o comando da Record e o governo de Jair Bolsonaro e Cia. são evidentes. As críticas à elite do atraso, à casa-grande, ao oligopólio da mídia – o Partido da Imprensa Golpista (PiG), como denominava – ao judiciário parcial, a lideranças políticas de todos os partidos (inclusive os progressistas, quando estes traíam os ideais deste campo, no qual Paulo Henrique Amorim inseria-se) eram feitas sobretudo em suas análises no canal do Conversa Afiada no YouTube.
Aos 77 anos, Paulo Henrique Amorim era um youtuber. Um digital influencer. Trouxe para o canal de vídeos na internet o zelo técnico e estético da televisão. Soube, porém, absorver o discurso e a narrativa típicas desse ambiente no ciberespaço. Pedia likes e inscrição no canal, e temperava com trocadilhos, metáfora e outras figuras de linguagem com o mesmo despojamento de um comunicador da geração x, y, alpha. Não escapou ileso a algumas escorregadas também – não era, tampouco se apresentava, como perfeito. Mas nenhuma derrapada foi por má-fé.

Ao contrário. Como declarou o colega de profissão e amigo Mino Carta, a fidelidade ao fato, à realidade factual, era a principal característica de Paulo Henrique Amorim. Seus pontos de vista, sua forma peculiar de comentar, analisar os acontecimentos nunca distorceram, deturparam, mentiram. A busca pela verdade factual sempre foi o norte para Paulo Henrique Amorim jornalista. Qualquer que fosse a linguagem.
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