A Índia desfruta de uma imagem forte e positiva no Brasil

Crédito: Bloco Bollywood.

No Centro de Soft Power da Fundação Índia, em Chennai, convidamos o Sr. Shobhan Saxena e Sra Florência Costa para interagir sobre a seguinte questão: “Do Soft Power  aos ganhos econômicos e políticos: o envolvimento da Índia com o Brasil e a região da América do Sul”. Saxena é o presidente da Associação Indiana do Brasil, além de um estudioso, empreendedor cultural e, junto com Costa, também fundador da BRIC Street, uma organização com sede em São Paulo que trabalha para criar uma comunicação cultural, colmatar o déficit de conhecimento e criar contato entre as pessoas, enquanto promove o comércio entre o Brasil e a Índia. Ele também é o fundador do Bloco Bollywood, o primeiro e único bloco de carnaval de rua indiano no Brasil.

Florência Costa é jornalista há mais de 20 anos e curadora cultural. Trabalhou como correspondente estrangeira em Moscou, Londres, Mumbai e Nova Délhi. É co-fundadora do Bloco Bollywood e co-fundadora da BRIC Street. Ela também é editora de um site brasileiro sobre cultura indiana. Conversamos com eles sobre o entendimento de suas iniciativas para viabilizar a Índia no Brasil através do Bloco Bollywood e de outras iniciativas.

A entrevista com Shobhan:

Quando você se mudou para o Brasil? Quais são algumas de suas áreas de trabalho e iniciativas para promover a imagem da Índia no Brasil e na América do Sul?

Mudei-me para o Brasil no ano de 2012, para trabalhar como jornalista. Nos últimos seis anos, reportei extensivamente para várias publicações indianas e estrangeiras sobre o Brasil e a América do Sul, incluindo a Copa do Mundo da FIFA 2014 e as Olimpíadas do Rio 2016. Também me concentrei na cooperação bilateral da Índia com o Brasil e sua atuação conjunta em fóruns multilaterais como BRICS, G -20, IBAS, G-4 e OMC, etc.

Além de reportar, lecionei cursos de política externa, política, sociedade e cinema na Universidade de São Paulo. Dou regularmente palestras sobre economia indiana e política externa nas principais universidades, think tanks e outras instituições do Brasil. Nos últimos seis anos, dei muitas palestras sobre a constituição indiana, Dr. B Ambedkar, Sardar Patel, Yoga e meditação, no Centro Cultural Indiano do ICCR em São Paulo. Como presidente da Associação Indiana (2016-2020), organizo festivais indianos como Holi, Diwali, Onam, Durga Puja, Dia da Independência e Yoga no Brasil, que atraem um grande número de expatriados indianos e amigos brasileiros .

Minha maior contribuição para a promoção da cultura indiana no Brasil foi a criação do Bloco Bollywood, um carnaval de rua indiano em São Paulo, onde tocamos música tradicional indiana e de Bollywood. Em apenas quatro anos, o nosso Bloco tornou-se uma das principais festas de carnaval de São Paulo, com grande cobertura da mídia nos principais canais de TV, jornais e revistas do Brasil.

Este ano, atraímos mais de 8.000 pessoas – indianos, brasileiros e outras comunidades de expatriados. Hoje, o Bloco é o maior encontro e festival indiano da América do Sul, com associações indianas de outros países pedindo para levar o Bloco Bollywood a lugares como Argentina e Chile. O Bloco ajudou a criar uma imagem muito positiva da Índia e de nossa cultura vibrante e colorida.

Crédito: Bloco Bollywood.

Quais são algumas das principais áreas de trabalho de sua esposa, Florência Costa?

Florência Costa, também jornalista de profissão, vive e trabalha na Índia há sete anos. Ela tem muito interesse e envolvimento com a cultura e festivais indianos. Co-fundadora do Bloco Bollywood, ela é fundamental na promoção do nosso Bloco entre os brasileiros e também na mídia local. Ela também é palestrante regular sobre questões relacionadas à Índia em vários meios de comunicação, think tanks e universidades.

Ela acabou de cobrir a eleição indiana de 2019 para a principal revista brasileira Veja, explicando aos seus leitores a vibração da democracia indiana. Ela criou um novo site chamado Beco da India (The Indian Street), um site em português, voltado para brasileiros que analisa a cultura indiana e as atividades culturais indianas no Brasil e em outros países da América do Sul. 

Conte-nos sobre a comunidade indiana no Brasil e suas áreas de trabalho.

Há um total de 5.000 indianos vivendo e trabalhando no país. A maioria dessas pessoas (3.000) está sediada no estado de São Paulo e na cidade de São Paulo. Todos os membros da comunidade são representados pela Associação Indiana do Brasil, que é a única organização indiana no Brasil. Os membros da comunidade indiana estão envolvidos em várias atividades como comércio (têxteis e bens de consumo), na área da educação como acadêmicos, em empresas de tecnologia da informação, farmacêutica, petróleo, alimentos e em atividades culturais.

A maioria das multinacionais indianas, como TCS, Infosys, Wipro, Reliance, Lupin, Dr. Reddy, Ranbaxy e Vedanta tem suas sedes latino-americanas em São Paulo. A comunidade está crescendo lenta, mas seguramente em número, à medida que o comércio e outros compromissos entre os dois países crescem.

Livro escrito pela jornalista Florência Costa,. Para adquirir o livro clique na foto. Crédito: Jaya Yoga.

O Bloco Bollywood parece ter gradualmente evoluído para uma bela demonstração de força para a diáspora indiana no Brasil. Como seus fundadores, o que você tem a dizer sobre sua evolução?

O verdadeiro carnaval brasileiro acontece nas ruas na forma de festas de música e dança chamadas Blocos. De alguma forma, a energia e a natureza dos Blocos no Brasil lembraram-me as procissões de rua que temos na Índia (Ganesha em Mumbai ou procissões de casamento nas ruas de qualquer cidade indiana). Em 2016, depois de morar aqui por mais de quatro anos, percebi que muitos brasileiros tinham interesse em danças e músicas indianas, especialmente Bollywood, mas eles realmente não entendiam suas nuances. Então eu, com minha esposa, decidi criar um bloco indiano como um experimento.

Nosso primeiro bloco aconteceu em fevereiro de 2016 em São Paulo. Convidamos os membros da comunidade indiana e nossos amigos brasileiros para a festa de rua. Mais de 700 pessoas, principalmente indianas, mas algumas brasileiras, apareceram. Foi um evento gratuito e não comercial aberto a todos. Por cinco horas, tocamos músicas de Bollywood, pop indiano e números de bhangra e dandiya, com pessoas dançando sem parar ao som da música. Devido à sua natureza única, o nosso Bloco recebeu ampla cobertura da mídia quando as pessoas apareceram em trajes indianos coloridos.

Crédito: Bloco Bollywood.

Hoje, em apenas quatro anos, tornou-se o maior evento indiano em toda a América do Sul. Em 2019, tínhamos mais de 8.000 pessoas em dois Blocos em locais diferentes. Apenas mostra o poder da música, danças e figurinos indianos para atrair pessoas. O Bloco também deu um grande impulso a todos os restaurantes indianos de São Paulo e todos os comerciantes indianos de tecidos beneficiaram-se com um aumento nas vendas de vestidos indianos perto do carnaval.

Dada a popularidade do Bloco, esperamos transformá-lo em um veículo importante para promover o Soft Power indiano no Brasil com o slogan “Felicidade e Paz”. Também estamos trabalhando em um projeto social para dar aulas gratuitas de inglês a crianças carentes e jovens presidiários, com o objetivo de melhorar a imagem da comunidade indiana no Brasil.

Crédito: CineFreak.

O que a BRIC Street faz? Quando foi fundada?

A BRIC Street foi fundado em 2018. Acabamos de abrir um escritório em São Paulo, com o objetivo de aumentar o contato pessoal entre a Índia e o Brasil, além de promover vínculos comerciais entre os dois países. Teremos dois sites: um para promover a cultura indiana no Brasil em língua portuguesa e o outro (em inglês) para funcionar como um centro de recursos  think-tank online para pessoas que trabalham nas relações Índia-Brasil.

Também planejamos organizar um seminário e conferência anual chamado India Dialogue Series em São Paulo, com o objetivo de promover vínculos comerciais, culturais e econômicos entre os dois países, além de mostrar a proeza cultural da Índia no Brasil e em outros países da América do Sul. Planejamos sediar a primeira edição em outubro de 2019, antes da Cúpula do BRICS no Brasil em novembro.

Crédito: Twitter da jornalista Florência Costa.

O que há na Índia que ressoa com a população brasileira?

O Brasil é um país onde a Índia desfruta de uma imagem muito positiva. Além disso, como a própria cultura brasileira é uma mistura de três culturas – européia, africana e indígena – as pessoas aqui são muito abertas a outras culturas. Coisas indianas como Yoga, Ayurveda e danças clássicas são bem conhecidas aqui. Comida indiana e Bollywood também estão tornando-se populares. O Bloco Bollywood gerou muito interesse sobre a Índia, com nossa equipe sendo convidada para os principais programas de TV e recebendo cobertura ao vivo nos principais canais do país e em jornais e revistas.

Hoje, o Bloco Bollywood tornou-se o principal veículo da cultura indiana no Brasil. Nós introduzimos a dança no estilo Bhangra, Garba e Bollywood nas ruas de São Paulo. Também treinamos uma equipe de bateristas da Universidade de São Paulo para tocar batidas Bhangra. Agora, uma das principais e emblemáticas escolas de samba de São Paulo quer fazer uma parceria conosco. Também estamos explorando a possibilidade de convencer os dançarinos folclóricos da Índia a introduzir diferentes formas de dança indiana no Brasil e criar uma fusão de música e da dança indiana-brasileira.

Você vê a influência do Soft Power da Índia traduzindo-se em fortes relações econômicas e políticas com o Brasil?

Sim, definitivamente o potencial existe. Mas um esforço conjunto deve ser feito pelo governo, organizações comunitárias, empresas indianas, centros culturais, câmaras de comércio e indivíduos influentes para que isso aconteça. Nesse sentido, é muito importante reunir todas as partes interessadas em uma plataforma comum e trabalhar regularmente e intensamente. O Indian Dialogue proposto pela BRIC Street é um passo nessa direção. Com recursos e esforços, pode tornar-se uma plataforma para promover negócios e comércio por meio do soft power indiano no Brasil e em todos os outros países da América do Sul.

Florência Costa (esq.) e Shobhan Saxena (dir.) no lançamento do livro “Os indianos”, publicado pela editora Contexto, em 2012. Crédito: http://indialinkbrasil.blogspot.com

Quando começou a Associação Indiana no Brasil e qual é sua visão e missão?

A Associação Indiana foi fundada em 1997. Naquela época, a comunidade era muito pequena e as atividades da associação eram limitadas à organização de alguns festivais para os membros da comunidade indiana. Com o aumento do número de indianos, empresas e atividades culturais no Brasil, a associação cresceu muito desde então, com um grande salto em número de membros e atividades. A associação tem três missões básicas: fornecer uma plataforma para os membros da comunidade indiana organizarem festivais e programas culturais indianos; promoção da filosofia e cultura indianas no Brasil e realizar atividades sociais para a comunidade local no país. A associação possui um grande pedaço (18.000 metros quadrados) perto da cidade de São Paulo e está trabalhando para desenvolvê-la como um centro comunitário e um local para promover a cultura indiana, especialmente Yoga e meditação.

Em entrevista ao site The Canadian Bazaar a jornalista Florência Costa sua viagem com a amiga Maria à Índia. Na foto, elas embarcam no Rajdhani Express. Crédito: https://www.thecanadianbazaar.com

Você poderia descrever mais sobre o site brasileiro de Florência e suas diferentes facetas?

O Beco da Índia (The Indian Street) analisará a cultura indiana com seções como Yoga, meditação, filosofia, culinária, música, dança, Bollywood, viagens, empresas sociais e inovação. O site, em português, será um centro de recursos completo para os brasileiros interessados ​​na cultura indiana. Ao mesmo tempo, será uma plataforma para todos os artistas, músicos e dançarinos envolvidos em atividades culturais indianas no Brasil. O site funcionará como uma ponte entre inovadores e empreendedores sociais para colaboração.

Yoga e filmes são definitivamente fortes pilares do Soft Power indiano. Quais são os aspectos futuros deste poder da Índia que podem aproximar o Brasil e toda a América do Sul, fortalecendo as relações?

Além da Embaixada da Índia no Brasil e do Consulado da Índia em São Paulo, que organizam vários eventos indianos, o principal organizador de eventos indianos aqui é a Associação Indiana. Com mais recursos, planejamos tornar esses eventos maiores e melhores para que mais brasileiros tenham uma exposição à cultura indiana.

Agora, como o Bloco Bollywood tornou-se popular em todo o Brasil, planejamos usá-lo como uma plataforma para promover a cultura indiana, filosofia, cinema, culinária, meditação, música, dança e outras formas de arte. Também planejamos juntar esforços com organizações locais para criar festivais em torno do tema Índia.

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A melhor maneira de promover a cultura indiana na América do Sul é criar um festival indiano itinerante, que pode viajar de um país para outro e também usar o talento local de cada país para dar uma exposição completa à cultura indiana a nossos amigos sul-americanos. Já estamos trabalhando na criação da Federação de Associações Indianas da América do Sul (FIASA), um coletivo de todas as associações indianas na América do Sul. Ativa em 2020, a Federação ajudará a reunir recursos para a promoção da cultura indiana e os vínculos comerciais com a América do Sul.

Fonte: Texto originalmente publicado em inglês no site do Center for Soft Power.
Link direto: http://www.centerforsoftpower.org/india-enjoys-a-strong-positive-image-in-brazil/

Sudarshan Ramabadran

É atualmente o vice-diretor da India Foundation. Formou-se em comércio em Chennai (Índia) e depois estudou jornalismo no Asian College of Journalism na Índia. Ele trabalhou anteriormente com o New Indian Express (um dos principais jornais do mundo) em Chennai e no Department of Information & Broadcasting do Governo de Gujarat, Gandhi Nagar. Ele também atuou como coordenador da Global Youth Wing of Chinmaya Mission (Renowned Spiritual Organisation). Seus interesses de atuação e estudo são: segurança, estratégia e relações internacionais.

Tradução:

Alessandra Scangarelli

Jornalista (PUCRS), roteirista, pesquisadora e tradutora. Especialista em Politica Internacional (PUCRS) e Mestre em Estudos Estratégicos Internacionais (UFRGS). Foco de análise e atuação: relações internacionais e estudos do audiovisual russo e asiático.

 

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