
A catarse coletiva causada em toda a sociedade ocidental pela conjectura do fim do mundo é algo muito interessante, e ao mesmo tempo único. Algo que está presente não apenas nos filmes baseados em teoria da conspiração, ou apocalipse zumbi, cuja sobrevivência é o desafio diário, mas também nos filmes mais comuns de gêneros que vão desde ação, passando por comédia e mesmo guerra, como é o caso do recente filme “1917” (2019), de Sam Mendes, e também no grande sucesso de Christopher Nolan do mesmo gênero, produzido no ano de 2017, “Dunkirk”.
Em primeiro lugar, é importante observar como foi possível a emergência da cultura do apocalipse na sociedade ocidental. Seitas cristãs, e mesmo os católicos no ano 1000 d. c. acreditavam que ali, naquele período, ocorreria a chegada do fim do mundo. Algo parecido viria a ocorrer no ano de 2000, quando até terras na lua eram vendidas a prestação. A ideia de apocalipse, isto é, o fim do mundo de maneira cataclísmica é estritamente ocidental, em especial em razão de sua origem judaico-cristã. Trata-se de algo que não é novo, mas que nem sempre esteve tanto em alta como na década atual.

Se na década de 1990 “O Resgate do Soldado Ryan” (1999), de Steven Spielberg simbolizava o modelo de herói ocidental, e “The Independence Day” (1996), de Roland Emmerich representava as lutas que aquele mundo enfrentava pela construção dessa sociedade, na sua triunfante cruzada contra os não-ocidentais, dentro da ideologia de Choque das civilizações, este modelo passou por uma transformação radical nas últimas três décadas. O sucesso entre o público estadunidense e europeu de filmes ou seriados relacionados ao fim do mundo era muito maior do que fora durante a Guerra Fria. Assim, o espaço explorado não era mais uma catástrofe nuclear, onde os seres humanos aniquilariam-se militarmente. A nova realidade era que a sociedade humana criaria as condições para sua própria destruição natural sem a necessidade de um enfrentamento entre si.
Na maior parte dos filmes e seriados relacionados a cultura zumbi, que já nasce no fim da Guerra Fria, mais especificamente no Japão- o país mais ocidentalizado da Ásia-, onde o jogo eletrônico Resident Evil é um primeiro exemplo, não existe um povo ou seres de outro planeta que destroem a sociedade humana, mas os próprios humanos criam o vírus que levaria a sua extinção. A partir do primeiro filme desta franquia, lançado em 2002, todos os outros relacionados ao gênero de sobrevivência ou apocalipse zumbi seguiriam mais ou menos o mesmo roteiro.
Filmes como “Impacto profundo” (1998), de Mimi Leder e “2012” (2009), de Roland Emmerich também exploram a cultura apocalíptica, embora sempre demonstrem que apesar do cataclisma global, era possível sobreviver a crise. Tais filmes, contudo eram muito mais uma espécie de mal-estar frente às crises econômicas sistêmicas, do que necessariamente um sentimento de decadência da sociedade. Até porque os retratos de decadência dos anos 2000 sempre se referiram muito mais a uma espécie de crise hegemônica da sociedade ocidental do que necessariamente ao fim do mundo.
Ridley Scott, renomado diretor de Hollywood fez ao menos dois filmes interessantes em que é possível ver isso, “O Gladiador” (2000) e “Cruzada” (2005), onde ele aborda dois momentos chave da história ocidental, a queda do Império Romano, e a capitulação de Jerusalém frente aos muçulmanos no século XII. Mesmo dentro da popularizada trilogia pre-sequel “Star Wars (Ameaça Fantasma, A Guerra dos Clones e A Vingança dos Sith) isso é encarnado na decadência da República Galática e a ascensão do Império Sith protagonizado pelos famosos vilões Darth Vader e o chanceler Palpatine, Imperador Darth Sidious.
No entanto, a cultura zumbi, fenômeno que se popularizou a partir de 2003 nos famosos HQs de “The Walking Dead”, fortemente inspirados pelo já popularizado “Resident Evil”– note-se que o HQ aparece apenas um ano após o lançamento do primeiro filme-, praticamente se funde com a ideia de apocalipse. A Crise de 2008 eleva o tom dessas criações, o que potencializou evidentemente o desenvolvimento de uma série de teorias da conspiração que se disseminaram naquele período. Contudo, é importante apontar que desde meados da década de 1980 tais teorias são fortalecidas, muitas vezes marcadas pelo retorno de um antissemitismo radical que não se via desde a Segunda Guerra Mundial, e que leva a mobilização da própria comunidade judaica para relembrar o Holocausto.

Porém, voltando a questão da cultura zumbi, desde o início ela é profundamente marcada pela ideia de luta pela sobrevivência, não apenas física, mas simbólica do ser humano e sua sociedade. A luta contra os zumbis não é apenas uma questão de morte física, mas filosófica acima de tudo o que até ali os povos do planeta tinham construído. Algo que nos faz concluir que a luta pela sobrevivência contra a barbárie humana é ironicamente marcada por um estágio primitivo de combate diário pela manutenção da civilização. Os inimigos não são apenas os zumbis, mas aqueles que são contra a continuidade da sociedade após o cataclisma apocalíptico, sejam aqueles que advogam pela sobrevivência dos mais fortes, ou os que defendem a primitivização social. Neste sentido, nada mais primitivo que a guerra.
A imagem heroica, compromissada com o futuro do mundo, do Soldado Ryan morreu, dando lugar ao sobrevivente, cabo William Schofield (George McKay)– personagem principal de “1917“. E abordando já as características deste filme, é possível dizer que sua proximidade e similaridade, embora com diferenças consideráveis em relação a “Dunkirk”, converge na ideia central de sobrevivência. Curiosamente, os dois filmes abordam duas derrotas estratégicas britânicas nas duas guerras mundiais, onde o primeiro aborda as operações britânicas defensivas durante a retirada alemã desenvolvida na operação Alberich entre março e abril de 1917, enquanto o segundo aborda o drama vivido pelos soldados e oficiais britânicos durante a retirada da Força Expedicionária Britânica de Dunquerque, nordeste da França em maio de 1940, conhecida como operação Dínamo.

Em ambos os filmes é possível ver que não existe o ato de heroísmo como se conhece tradicionalmente no ocidente desde o fim do século XIX. A única preocupação dos soldados na frente de batalha é a pura sobrevivência do conflito, e o inimigo não é nem ao menos possível de se identificar em ambos os filmes. Em uma das mais simbólicas, e inclusive raras cenas de diálogo, em que ocorre um confronto de visões sobre a guerra entre os cabos encarregados da missão de levar a mensagem sobre o cancelamento do ataque às forças em retirada, é no debate moral sobre a ideia de herói, onde ao questionar Schofield sobre o destino da medalha ganha na Batalha de Somme, o outro cabo, Thomas Blake (Dean-Charles Chapman), fica surpreso ao saber que ela fora trocada por um vinho francês, e explana quase que naturalmente ’’…que desperdício…’’.
Embora se saiba que o inimigo em ambos os casos são os alemães, o que protagoniza a guerra não é a luta entre duas partes, isto é, o vilão e o mocinho- que neste caso não é algo nem ao menos marginal no filme-, mas os desafios ’’naturais’’ superados pelo Cabo Schofield para o cumprimento de sua missão. Isso é parte da própria filmagem do filme, que embora alguns critiquem por parecer-se com um jogo eletrônico, é parte característica da própria construção proposta pelo diretor. As cenas de confronto com o inimigo, bem pouco a vista são divididas com uma espécie de desbravamento da zona de ninguém na frente de batalha recheada de perigos e barreiras ’’naturais’’ igualmente mortíferas de maneira contínua.

Em ambos os cenários, também não é possível identificar de maneira aberta pelo que se está lutando, algo curioso, pois a guerra torna-se algo puramente irracional, cujas motivações tornam-se apenas oriundas de sentimentos primitivistas da sociedade humana, e não caracterizadas por questões políticas e ideológicas. Uma das características centrais da Primeira Guerra Mundial é a luta pelos mercados mundiais e recursos estratégicos, com um caráter imperialista, omitir isso é mascarar uma importante motivação histórica da guerra. Isso leva a uma espécie de sentimento ’’romântico’’ em relação a guerra, onde ao invés da tragédia oferecida por Chritopher Nolan em “Dunkirk”, Sam Mendes traz uma espécie ’’naturalização’’ da ideia de sobrevivência.

Um pensamento oriundo de uma espécie de ideologia antropológica da guerra, que remonta Carl Von Clausewitz, que escreveu em “Vom Krieg”– Sobre a Guerra– onde descreve ser o conflito militar algo tão inato ao ser humano como respirar e andar. Isto é, uma necessidade fisiológica. Naquele momento inclusive ao buscar desenvolver uma espécie de ciência da guerra, Clausewitz constrói todo um arcabouço teórico que no auge das grandes guerras mundiais do século XX tratará a guerra como algo científico, e não político. Contudo, Hitler, no auge do irracionalismo da Alemanha nazista, busca inverter essa ordem, tratando a guerra como algo inato ao povo alemão a partir de uma ’’herança cultural militar’’ dos povos nórdicos. Isso não necessariamente leva a uma negação do escritor prussiano do século XIX, mas a inversão de seu raciocínio- algo que nas décadas de 1980 e 1990 fez sucesso entre estudiosos das academias militares estadunidenses.
Esta inversão aparece na contraposição do “Soldado Ryan” com “1917” e “Dunkirk”, onde se retira da guerra todas as suas características sociais e políticas, reforçando ao mesmo tempo não apenas a ideologia zumbi, como resgata de maneira sorrateira a ideia do ’’vale tudo pela sobrevivência’’, onde a guerra faz parte da ’’cultura.’’ Uma ideia que está intrínseca no pensamento fascista que, a partir de 1970, vem ganhando cada vez mais espaço na sociedade ocidental. A ideia de raça, bem como luta pela sobrevivência é algo que esteve presente no discurso nazifascista para justificar o imperialismo das potências do eixo, mas que também estão presentes no próprio discurso de solidificação do Estado Moderno ocidental.

A ’’cultura da sobrevivência’’ é marcada pelo militarismo, ou seja, a guerra contra o outro, que sempre é o diferente. Elementos que são basilares do pensamento fascista, que ao adquirir certos vernizes niilistas e conspiracionistas, e que apesar de flertarem com posições antissistêmicas, reforçam a mesma estrutura autoritária a partir da ’’ordem e civilização’’ vigentes- mesmo que marcadas pela barbárie-, pois o caos neste caso é a própria ordem.
Certamente tais ideias podem ser consideradas um desdobramento direto da teoria do Choque das civilizações, porém deve ser considerado enquanto parte de seu estágio mais agressivo, pois representa o fim da ideia de humanidade no sentido universal kantiano que se conheceu ao fim da Segunda Guerra Mundial, enquanto discurso das potências ocidentais. A filosofia da sobrevivência representa o mais radical retorno a ideia fascista de defesa da civilização, e não por acaso a mesma se dissemina em um momento em que este tema ganha força em todo o mundo, junto com a erosão das instituições internacionais estabelecidas após a Segunda Guerra Mundial.
A morte do Cabo Thomas Blake, retratado como exemplo de heroísmo no filme “1917”- falecimento curiosamente causado por sua bondade em querer tratar da saúde de seu inimigo-, bem como a sobrevivência do parceiro, Cabo Schofield, presente na missão por pura obrigação, e não por opção de heroísmo do personagem, demarca a nova realidade desta nova ideologia. Embora ela tente desideologizar todos os aspectos da vida humana- algo típico do liberalismo-, ao reforçar esta ideia de sobrevivência solidifica a ideia de crise cataclísmica junto ao apocalipse judaico-cristão. Portanto, partindo da ideia hollywoodiana de que a humanidade e o individualismo são uma coisa única- outra típica ideia liberal-, não existem alternativas políticas, sociais ou ideológicas ao fim do mundo, afinal neste tipo de raciocíonio tudo é sobrevivência, não é?
Seria, porém esta leitura cataclísmica, a única possível prognosticada na sétima arte sobre o fim do mundo enquanto decadência? Aliás, não existem alternativas políticas, sociais e econômicas às atuais existentes que dilapidam os recursos do planeta e destroem sociedades e culturas inteiras? O próprio cinema mostra que o apocalipse, ou cataclisma sistêmico não significa necessariamente este discurso de luta pela sobrevivência, mas a possibilidade da emergência de algo diferente. Algo completamente novo.

Um filme curioso, cujo sucesso não foi muito grande, mas que vale apena conferir é “Daybreakers” (2010), de Michael Spierig e Peter Spierig (no Brasil 2019: O Ano da extinção). Neste filme, o apocalipse não é o fim da sociedade humana, mas a sua transformação em Vampiros– um símbolo curioso de parasitismo social na literatura dos séculos XVIII e XIX-, onde os sobreviventes eram usados como cultivo para alimentação dessa casta dominante. Outro filme curioso, que trata de um futuro distópico é “Bacurau”, que embora não trate diretamente do fenômeno apocalipse, vê na emergência do autoritarismo e do colonialismo a catástrofe da sociedade brasileira.
Logo, é possível dizer que apesar da forte influência da fundida ideologia judaico-cristã de apocalipse com a teoria do Choque de civilizações, existem visões alternativas de um cataclisma social que signifique não o fim de tudo, mas de um determinado modelo de sociedade. Algo que demonstra que a própria ideia de crise sistêmica é orientada de maneira ideológica a se contrapor a qualquer possibilidade de alternativa ao capitalismo, que não consegue apontar para nenhum outro caminho que seja sua dissolução. Portanto, isso não significa uma glorificação do Soldado Ryan, ou defesa do Cabo Schofield, mas a possível superação da própria ideia atualmente existente de herói que por séculos foi construída na sociedade ocidental, tendo como centro um indivíduo ou grupo de pessoas especiais- algo completamente judaico-cristão, oriundo de um certo messianismo.

Esta confusão dirigida, gerada pela decadência do ideal messiânico- apenas possível em razão da crise de caráter político e ideológico-, é a causa desta catarse coletiva individualista que leva a sociedade ocidental ao pânico no atual momento de expansão do Coronavírus- Covid 19, onde teorias conspiracionistas, bem como o fascismo, ganham fértil terreno para expandir-se. A inexistência de mocinhos e vilões, bom e mau, amigos e inimigos é o que marca uma radical verticalidade na construção de uma individualidade social de um sistema, que vivendo em constante crise não consegue mais indicar um horizonte de expectativas alternativo para um sistema social em claro e evidente colapso.
Contudo, os contornos apocalípticos ganhos pela atual crise econômica mundial, bem como da crise de hegemonia do ocidente, somada à pandemia do Covid 19, são assim desenvolvidas a partir da própria ideia de cataclisma, não importando se a China e os países não ocidentais estão conseguindo ou não conter a doença. O que se trata é da decadência da sociedade ocidental, a ponto de Pequim ter se tornado não apenas a esperança de combate ao vírus, mas um modelo alternativo de modernidade e futuro, que não é possível se ver ainda em razão da ideologia apocalíptica, oriunda da agonizante cultura judaico-cristã que encontra-se hoje em seu máximo limite, a ponto de retornar a pensamentos medievalescos em pleno século XXI.
Críticas:
GUEDES, Renê. A guerra como evento trágico em “Dunkirk”. 2019. Disponível em: https://revistaintertelas.com/2019/02/04/a-guerra-como-evento-tragico-em-dunkirk/.
MENDONÇA, Thiago B. 1917 de Sam Mendes, e a desumanização. In: Época. 2020. Disponível em: https://epoca.globo.com/thiago-herdy/coluna-1917-de-sam-mendes-a-desumanizacao-1-24229013.
OMELETE. 1917- Crítica negativa: Sam Mendes esvazia o horror da guerra em narrativa de fetiche. 2020. Disponível em: https://www.omelete.com.br/filmes/criticas/oscar-1917-critica-negativa.
______. 1917- Crítica positiva: Filme de Sam Mendes indicado ao Oscar 2020 retrata o alto custo do heroísmo em jornada emocional e autêntica. 2020. Disponível em: https://www.omelete.com.br/filmes/criticas/oscar-1917-positiva.
Vídeos:
“Dunkirk” (2017), de Christopher Nolan
“1917” (2019), de Sam Mendes
Hudson, gostaria de esclarecer três pontos aqui.
Primeiro, eu não disse que a ideia de apocalipse foi inventada por seitas cristãs. Deixei claro que sua origem remonta a cultura judaico-cristã. Essa cultura (Judaico-cristã) se desenvolveu por milênios no mediterrâneo oriental (Gregos, Fenícios, Hebreus, Assírios, Persas, Egípicios, Romanos e vários outros povos contribuíram para isso), e agrega inclusive o que hoje conhecemos enquanto islamismo como uma espécie de variação árabe dessa cultura. Eles também acreditam no apocalipse. Fato é que vários povos tem sua forma de acreditar no fim do mundo, isso não significa que uns são melhores do que outros, apenas que são diferentes. Porém, o que ressalto neste texto é como a própria ideia de fim do mundo, mesmo a cristã é suscetível a mudanças históricas. (Inclusive dentro do próprio cristianismo), ainda que eu não aprofunde isso. Além disso, a ideia de apocalipse pode ser mais presente em certos períodos que outros como a história demonstra, e que eu fiz questão de destacar na oposição Soldado Ryan e 1917. Inclusive no fim demonstro como é possível existirem outras ideias de fim do mundo, apocalípticas para além das que conhecemos advindas da cultura judaico-cristã. Apesar do apocalipse, isto é, o fim de tudo ser uma ideia judaico-cristã, a ideia de fim do mundo não é. Maias acreditam na ideia de ciclos por exemplo, e que o fim do mundo, isto é, um cataclismo significa o fim de um período e início de outro. Não o fim de tudo o que conhecemos.
Caso você se refira ao último parágrafo do texto, onde destaco os contornos da atual crise, e as alternativas apresentadas, em especial por um pensamento que sobrepasse a ideia de apocalipse saiba que ali expus algo que a própria sociedade ocidental manifesta em todos os seus aspectos históricos, políticos, sociais e culturais desde a Segunda Guerra Mundial. Não vou entrar neste assunto, mas para resumir, quando a ideologia colonial, usando-se da ideia cristã de missão universal (Seja religiosa, civilizacional ou política) se aventurou pelo mundo reconhecendo-se a sí mesma como superior racial e ideologicamente, e viu isso cair no século XX, entrou em uma crise existencial e filosófica profunda que ainda hoje não se recuperou. Isso significou que eles não eram mais um grupo especial acima do resto do mundo, mas parte de outros dentro do mundo. Exatamente por isso, coloco que essa ideologia está agonizando, ela está em desmantelamento consciente, e em suas concepções, isso significa seu fim.
Segundo, não coloquei em nenhum momento que a visão de Spielberg sobre apocalipse e outros diretores são ”bonitas”, sempre busquei ressaltar a diferença entre as ideias, não se são melhores ou piores. Inclusive, fazendo aqui uma breve operação de análise do Resgate do Soldado Ryan, posso dizer que ele é uma propaganda extremamente bem feita de como o papel do Exército dos Estados Unidos no mundo era ”justo” para convencer seu próprio povo de que lutar guerras, mesmo que por uma única pessoa é importante- isso em um momento em que este mesmo país violava direitos internacionais de países soberanos como Yugoslávia e Iraque. No entanto, se eu falar de Ridley Scott e os filmes que eu citei, é algo ainda mais significativo, pois ali não busquei positivar sua visão de fim do mundo, que não é o mundo em sí, mas a civilização ocidental- isso também é uma ideia de apocalipse. A Queda do Império Romano e de Jersualém são episódios ligados diretamente a cultura judaico-cristã, o que nos leva a crer que a atenção do diretor não é com a construção de um apocalipse em suas palavras ”bonito”, mas que na verdade a tragédia é a decadência dessa própria cultura.
E por último, o elogio ao ser humano é por parte de quem? Dos diretores ou minha?
No caso de ser dos diretores, ressalto que não é elogio ao ser humano, mas uma ideia de heroísmo como coloquei ao longo do texto. Uma ideia substituída por sobrevivência. Isso não significa que o heroísmo seja melhor que a sobrevivência. Ambos estão confinados a seus períodos históricos determinados. Um filme como O Resgate do Soldado Ryan desenvolve em muitos o desejo de se alistar no Exército para combater em guerras de interesses coloniais em lugares do mundo que essas pessoas nem ao menos sabem que existem. A ideia de sobrevivência por sua vez é a exaltação do individualismo humano máximo, o salve-se quem puder, a lei do mais forte- que como disse é uma ideia com fortes vernizes fascistas.
Se é de minha parte que você vê um elogio ao ser humano, saiba que a própria ideia de humanidade é um conceito, isto é, uma palavra que exprime uma série de ideias construídas historicamente. Elogiar a humanidade pode significar elogiar uma ideia abrangente de sociedade uniforme, algo que só uso em extrema necessidade, e que inclusive não considero correto enquanto um historiador. O planeta terra é habitado por diversos povos de diversas culturas diferenciadas, logo quando se fala do elogio do ser humano, se traz uma ideia extremamente vazia. Sempre que usei a palavra humano no texto, tive o cuidado de inserir a mesma como um conceito histórico usado pelos autores e membros da sociedade ocidental para retratar de maneira uniforme todas as sociedades do mundo, mas que é oriunda da própria cultura judaico-cristã ocidental. Inclusive exponho que a emergência da ideia de sobrevivência resulta na crise direta da ideia de humanidade no sentido filosófico kantiano. E mais uma vez ressalto que não estou fazendo julgamento de valor sobre a ideia de humano, mas a trato como uma ideia histórica e filosófica- tanto quanto a ideia de apocalipse. A crise de ambas as ideias não são um acaso. Mas este é um outro assunto.
Invenção *
Spilberg *
Corretor mudou as palavras acima.
Gostei de algumas partes dos comentários, só não entendo e acho estranho elogiar o ser humano, no caso os diretores e criadores de alguns filmes citados e colocar como invesão de seitas cristãs o fato do Apocalipse ( o Spulberg e outros você acredita e acha bonita a visão de Apocalipse, porém os cristãos que seguem a orientação bíblica são seitas e malucos).