“Modernismo” não significa “ocidentalismo”

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Huntington, o autor de “Choque de Civilizações” e um conhecido cientista político, argumentou que pessoas de diferentes nacionalidades frequentemente respondem à questão de “quem somos” pelo que é mais significativo para elas, ou seja, definindo-se em termos de ascendência, religião, língua, história, valores, costumes e instituições. No contexto atual de globalização econômica e pluralismo cultural, quais são os elementos básicos dessa “consciência coletiva” como a identidade cultural da nação chinesa e a coesão social que mantém o povo chinês unido? Como ela foi moldada? 

O professor Cristiano Barreto da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ), abriu recentemente um diálogo entre modernidade e tradição, usando o confucionismo como ponto de entrada para explorar os símbolos culturais e a identidade do povo chinês contemporâneo. A palestra fez parte de uma série de palestras especiais “Into China” organizadas pela Universidade Federal Fluminense (UFF) em colaboração com a Universidade Normal Hebei na China, com o tema “Identidade Chinesa: Diálogo entre Sociedade Contemporânea e Tradição”. 

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Que culturas, ideias e valores moldam a identidade cultural do povo chinês? 

Logo no início da palestra, o Barreto fez várias perguntas: Quais são as características culturais da China? Como a história, a tradição e os valores moldam a identidade cultural do povo chinês? Nos milhares de anos de história da civilização chinesa, existem alguns eixos que podem manter-se firmes diante de várias mudanças, e são marcados com raízes chinesas”? 

Com tais dúvidas, o Barreto listou pela primeira vez alguns sistemas de consciência psicológica social como conhecimento, valores e ideais formados pela nação chinesa na longa história. Ele acredita que a identidade cultural do povo chinês se baseia em grande parte em sua história, tradições e costumes, entre os quais estão alguns “eixos” da civilização chinesa. Por exemplo, a língua e a escrita chinesas, como portadoras da civilização, foram transmitidas aos tempos modernos. 

Ele também mencionou que a história antiga e moderna da China tem sido acompanhada por uma simbiose de duas emoções: orgulho das conquistas feitas ao longo de milhares de anos e medo da desintegração da família e da nação. Além disso, o conceito de “Paz no Mundo”, como ideal utópico para o chinês, carrega os valores e a identidade cultural do povo chinês e o une. 

Como a identidade cultural dos chineses lida com o impacto da civilização ocidental? 

No entanto, nos séculos XIX e XX, na transição para a modernidade, a base cultural da nação chinesa foi impactada pela civilização ocidental. Barreto salientou que por volta do século XVII, o ocidente embarcou num movimento progressivo em direção à civilização moderna com o início do Iluminismo e da Renascença, que defendiam a separação da igreja e do estado. O individualismo de autoconsciência, autoafirmação, autocriação e auto-realização tornou-se a marca da modernidade ocidental, e tal individualismo e liberalismo se refletem em toda a sociedade, dando origem ao capitalismo ocidental e à democracia. 

Com a expansão da civilização ocidental, esses pensamentos ocidentais se espalharam por todos os cantos do mundo, abalando fortemente as tradições culturais inerentes às regiões não europeias. A partir do século 19, os poderosos navios e canhões do Ocidente quebraram a política de portas fechadas do dinastia Qing, mas isso também foi um sinal do início da modernidade da China aos olhos de Barreto. 

Desde então, a China tem oscilado constantemente entre aceitar e negar a cultura ocidental, e tem havido as ideias de cultura chinesa em base e tecnologia ocidental em prática” no Movimento de Ocidentalização e a tendência ideológica de criticar Confúcio, o anti-confucionismo e abraçar a cultura ocidental em o Movimento da Nova Cultura. Uma vez foi sugerido que a China deveria aceitar totalmente a modernidade ocidental e abandonar completamente sua própria identidade cultural e tradições culturais. 

Mas, como disse o Barreto, um país ou nação deve ter seu próprio sistema de valores e identidade cultural, e “modernismo” não significa “ocidentalismo”. Assim surgiu o renascimento do confucionismo, que passou a substituir o ocidentalismo como símbolo da adaptação chinesa à modernidade. 

Como o confucionismo mudou nos tempos modernos? 

Barreto explica que na história do desenvolvimento da nação chinesa, o confucionismo experimentou três ondas de desenvolvimento, cujos três pontos altos foram durante as dinastias Han e Tang, as dinastias Song e Ming, a China contemporânea. Hoje, o confucionismo está voltando com força e tem grande potencial de desenvolvimento no equilíbrio dos valores tradicionais chineses com a identidade cultural da sociedade contemporânea. 

O professor acredita que o confucionismo pode ser usado como antídoto para as falhas do liberalismo e do individualismo e como receita para a harmonia social, formando um novo humanismo baseado no confucionismo. Em sua opinião, hoje, o confucionismo absorveu parte da essência do confucionismo da dinastias Song e Ming. Estes incluem a promoção da meritocracia” na China como alternativa às eleições do Ocidente, a possibilidade de selecionar e promover funcionários públicos de excepcional capacidade e virtude, a reintrodução da ideia política de “servir o país com cortesia” e o ideal social de permitir que cada membro da sociedade tome seu lugar, cumpra seu dever e esteja em sua posição. 

Ao mesmo tempo, porém, o confucionismo moderno também passou por algumas mudanças significativas, como a remoção de algumas teorias metafísicas, um maior foco na filosofia sócio-política e no pragmatismo, focalizando no bem-estar da sociedade, e como resultado, tornou-se mais popular. Ele enfatiza que os estudos do confucionismo e da modernidade numa perspectiva culturalista concentram-se na adaptação e desenvolvimento de soluções apropriadas à China.

Eles têm as seguintes características: recuperam o importante posicionamento da cultura tradicional na sociedade contemporânea; rejeitam o modelo ocidental de modernidade e tornam a tradição chinesa compatível com a sociedade moderna; recusam-se a confundir modernização com ocidentalização; e argumentam que a tradição chinesa pode adaptar-se aos problemas de pós-modernidade trazidos pela civilização ocidental. No final da palestra, o Barreto concluiu que não existe uma identidade cultural ou ideologia única que defina os chineses, e a rotulagem deve ser cuidadosamente evitada. Ao mesmo tempo, o modelo de desenvolvimento europeu centrado na história pode ser substituível, mas o que precisamos fazer não é erradicá-lo, mas buscar uma base comum, preservando ao mesmo tempo as diferenças e engajar-se em um diálogo ativo com a civilização ocidental. 

Duan Muxin 
Diário Chinês para a América do Sul
Traduzido por Pan Luodan

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por Anders Noren

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