Na guerra contra o Covid-19, China e Rússia lideram a solidariedade mundial

Crédito: voxeurop.

’’A pandemia não conhece fronteiras e traz o melhor da humanidade. Cedo, a comunidade internacional ofereceu suporte e suprimentos médicos para a China nos tempos mais difíceis. Como a situação interna tem melhorado, a China iniciou a prover assistência para outros países em necessidade urgente, com isso, prossegue com a sua capacidade de continuar a fazer um bom trabalho na prevenção e controle de epidemias domésticas.’’

Geng Shuang, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da República Popular da China.

Geng Shuang, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da República Popular da China. Crédito: Ministry of Foreign Affairs of People’s Republic of China.

Essas palavras refletem o atual ’’espírito de ação chinês’’ dentro da comunidade internacional. O tempo em que os problemas internos de cada país correspondiam apenas a eles mesmos, já não existe, e o processo evolutivo da globalização, que favorece cada vez maior interconexão entre povos, culturas e sociedades, não permite o isolamento dos problemas mundiais. Como disse certa vez o próprio presidente do país:

’’Este é o mundo em que todos os países interligam-se e tornam-se interdependentes em um nível sem precedentes. Os seres humanos convivem em uma mesma ’’aldeia global’’, onde a história e a realidade confluem, formando uma comunidade de destino comum em que cada um tem em si um pouco dos outros.(…) Face às mudanças profundas na situação internacional e às necessidades objetivas de todos os países, como passageiros do mesmo barco, devemos impulsionar conjuntamente a construção de um novo tipo de relações internacionais centradas na cooperação e no benefício mútuo. Os povos dos países devem trabalhar juntos para proteger a paz mundial e promover o desenvolvimento comum.’’

JINPING, Xi. “A Governança da China”. Editora Línguas Estrangeiras, 1º Edição, Beijing, 2014, pp. 328 e 329

Xi Jinping visitando a cidade chinesa de Wuhan, província de Hubei. Crédito: UOL.

A crítica condição de epidemia no país, que teve como ponto de difusão a cidade de Wuhan, localizada na província de Hubei, foi superada a partir de diversas medidas governamentais, mas sobretudo se deveu a capacidade madura do povo chinês de responder positivamente as duras orientações sanitárias. Ressaltar a já clara superior capacidade de organizar e planejar chinesa seria, utilizando um jargão popular, ’’chover no molhado’’, é importante evocar-se algo para além disso, que em si já é algo extremamente impressionante.  O empenho solidário e disciplinado de um povo entusiasmado na construção de um novo modelo de sociedade na história da humanidade é a força que move a Nova China.

O individualismo liberal que durante séculos perdura na sociedade ocidental, pela força imposto a diversos povos, inclusive o chinês por um período de 100 anos, mostra hoje suas limitações concretas. A ideia de que um povo ou grupo enquanto guardião da ordem e das principais decisões mundiais não possui mais hoje espaço concreto, algo que havia ficado evidente a partir da crise econômica mundial iniciada em 2008, bem como com os sangrentos conflitos bélicos em todo globo. Um cenário em que junto a China, a Rússia também tem assumido um papel importante na proposta de uma nova realidade mundial, marcada pela cooperação e desenvolvimento conjunto.

Ajuda humanitária da Rússia para a Itália. Crédito: Financial Times.

As ajudas fornecidas por Pequim e Moscou a Itália, iniciada a partir da segunda quinzena deste mês de março, é apenas mais uma das centenas que estes países já fornecem a outros povos em situação crítica. Os aviões militares russos com ajuda humanitária e médica aos italianos, que chegaram na semana passada, são os mesmos que estão já em operação na Síria desde meados de 2016- constantemente atacados ou mesmo omitidos nos veículos de comunicação ocidentais. Da mesma forma, a ajuda chinesa a península itálica já se dá com países como Paquistão e Irã desde o aparecimento dos primeiros casos do Covid-19. Outros países como Cuba- mesmo que sob cerrado bloqueio militar e econômico- ajudam com o melhor que possuem, que são os seus médicos, fornecendo seus serviços aos povos atingidos pela doença na comunidade internacional.

Estas são ações que não podem passar desapercebidas do povo comum, e muito menos das autoridades políticas do planeta. O maior recurso da humanidade é sua própria saúde e felicidade das pessoas, portanto antes de qualquer interesse particular, é necessário pôr o interesse maior do povo, a vida, à frente. O fundador da Nova China, o estadista revolucionário Mao Tse-Tung sempre observou a importância de se buscar servir o povo de todo o coração, colocando seus interesses, aspirações e necessidades acima de tudo. Estes são os princípios que guiaram não apenas as medidas tomadas em Wuhan, seja pelo governo, ou pelo povo, mas que também guiam a solidariedade dos chineses com os demais países do mundo neste momento.

A Rússia, cujo o número de casos é baixo em comparação aos países ocidentais, e que adotou medidas restritivas paulatinamente desde janeiro demonstra um cuidado semelhante com a população, bem como a sua solidariedade. Mesmo possuindo dificuldades internas por causa da ’’guerra de sanções econômicas’’ velada dos Estados Unidos desde 2012, a Rússia também vem protagonizando parte desta guerra que já realiza no âmbito da luta contra o terrorismo na Síria, que tanto aflige ao povo deste histórico país, quanto a própria República Bolivariana da Venezuela sob cerrado bloqueio econômico.

Um papel solidário de Moscou já assumido a mais de um século, seja durante a Segunda Guerra Mundial, quando destruiu o grosso das forças nazi-fascistas e libertou diversos países do leste europeu, e contribuiu para a expulsão japonesa no nordeste da Ásia. Outro exemplo foi quando diversas vezes na ONU apoiou as aspirações soberanas de países agredidos pelo colonialismo na África e Ásia.

Neste sentido inclusive, é importante citar as palavras sobre solidariedade da Porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Federação Russa, Maria Zakharova, durante a conferência de imprensa fornecida em 19 de março de 2020:

’’Queria também dizer que em princípio a pandemia do coronavírus é um verdadeiro teste da nossa humanidade, incluindo nos assuntos internacionais. É um teste da nossa habilidade e prontidão para continuar sendo humanos nos momentos mais difíceis. De uma habilidade e prontidão não só de cada uma pessoa, mas de Estados também, de agir de forma responsável e solidária contra novos desafios globais que não têm fronteiras nacionais.

Infelizmente, muitas vezes esta solidariedade é substituída por motivos ideológicos ou nacionais, egoísmo de potências e países que aspiram à hegemonia global e exclusividade. No mesmo momento em que os Estados, que se posicionam como líderes mundiais, poderiam manifestar essa liderança, dar um digno exemplo de apoio econômico e de como se pode confrontar o novo desafio nas áreas interna e externa, por alguma razão eles descartam essa oportunidade. (…)

Maria Zakharova, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da Federação Russa. Crédito: Facebook da Embaixada da Rússia no Brasil.

Não posso deixar de comentar o exemplo gritante da Venezuela e suas relações com o Fundo Monetário Internacional. Como se sabe, o Fundo mobiliza recursos significativos (até 1 trilhão de dólares) para apoiar os países a contrariar o impacto do surto de coronavírus. A solicitação de 5 bilhões de dólares, assinada pelo presidente venezuelano Nicolas Maduro, foi submetida oficialmente ao Diretor Executivo do FMI. E um funcionário do FMI acaba por anunciar que o Fundo “não está em condições” de analisar a solicitação diante da “falta de clareza envolvendo o reconhecimento internacional” do governo da Venezuela por parte de alguns países-membros.

Durante anos temos recebido declarações sobre preocupação com direitos humanos, sobre atividades da comunidade internacional para o bem do povo venezuelano. E agora, literalmente há uns dois meses, o povo venezuelano pediu ajuda no momento em que precisava tanto dela, tal como muitos outros países.

Queria ressaltar que tudo isso acontece no meio de declarações incessantes dos altos funcionários dos EUA sobre a intenção de reforçar ainda mais as sanções contra a Venezuela. É discutida até a possibilidade de introduzir um bloqueio naval do país. Em nossa opinião, é absolutamente inaceitável. Quem vai sofrer desta política? Pessoas comuns, os venezuelanos. É uma típica hipocrisia.

Acrescente-se as palavras anteriores que o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, no dia 26 de março, em plena pandemia, acusou sem fundamento algum o presidente venezuelano de ligação ao narcotráfico, bem como ofereceu uma recompensa de 15 milhões de dólares por informações que levassem a sua prisão, no melhor estilo faroeste. Aqui se vê que os princípios da solidariedade que o ocidente diz cultivar, como destacado, por vezes, não ocorre a todos os países, atingidos ou não pelo Covid-19.

A imprensa ocidental em nenhum momento deixou de destilar seu racismo para com os chineses, onde o The Wall Street Journal e o The New York Times em especial publicaram artigos ofensivos, que inclusive culpam o governo chinês pela nova pandemia. No Brasil, onde recentemente o país tornou-se uma espécie de apêndice dos interesses estadunidenses na região, foi reproduzido um destes tristes artigos na Revista Época– curiosamente a mesma que responsabilizou sem provas o presidente russo, Vladimir Putin, de derrubar o famoso Boeing da Malasya Airlines no leste da Ucrânia em 2014.

No entanto, como se já não bastasse isso, irresponsáveis declarações também vem de algumas lideranças como o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que denomina o Covid-19 de ’’vírus chinês’’, reproduzida de maneira automática pelo filho do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro. No entanto, não apenas de declarações irresponsáveis vivem ambas as lideranças dos respectivos países, mas também de ações.

Na contramão das ações solidárias para com os demais povos, feitas por todos os países do Grupo BRICS– em que o Brasil continua integrante, a despeito de suas atitudes ofensivas, indecorosas e desalinhadas com os princípios que norteiam o grupo-, o Brasil age de acordo com o velho individualismo liberal, mesmo para com o seu próprio povo. Pelo menos a nível da presidência da república que mandou a população brasileira de volta às ruas em plena pandemia mundial do Covid-19, que já vitimou mais de 3 mil pessoas no momento em que este artigo está sendo escrito.

A solidariedade, tão cara, e proferida pelo cristianismo reivindicado pelo presidente, torna-se então pura demagogia, onde a ação encarna um triste provérbio conhecido: “cada um por sí, e Deus por todos”! Prática semelhante reproduzida pelo presidente estadunidense que embora hoje não negue mais a presença do vírus no território, e tenha deixado de usar desde a reunião do G20 o termo ’’vírus chinês’’, mantém parcialmente um discurso de salvar a economia primeiro e o povo depois.

Não deixa de ser impressionante a falta de cuidado e responsabilidade dos mesmos para com aqueles que deveriam representar os interesses. Isso é fruto direto de uma ideologia retrógrada, putrefata, decadente e mesquinha em que se diz que não existe sociedade e sim indivíduos. Portanto, não é surpresa que as mesmas lideranças que sejam irresponsáveis com o seu próprio povo, venham querer acusar outros países, de maneiras racistas ou não, ou mesmo tentar dar pseudo-lições morais, como se estivessem acima do certo e errado.

Mesmo entre os povos, que muitas vezes na história trataram os chineses e russos com desrespeito, como é o caso da Europa- e por vezes ainda o fazem-, a crise é usada como oportunidade de parceria e cooperação, e não para vingança ou ajuste de contas em razão de rivalidades históricas. Eis o espírito de ação do tempo presente. O protagonismo sino-russo, bem como de outros países, que muitas vezes pouco tem a oferecer, mas ainda assim o fazem por ter entendimento da gravidade do momento, a exemplo dos médicos cubanos que estão presentes em várias partes do mundo para ajudar na contenção do vírus é essencial como exemplo para as gerações futuras. Estas ações não podem, não devem e nem jamais serão esquecidas pelos povos do mundo.

A atitude de russos e chineses representa também um momento de transição na história da humanidade. Estão sendo lançadas as bases materiais e ideológicas do início da construção de um novo mundo, baseado no respeito, igualdade e solidariedade. Mundo em que o espaço para individualismos e interesses particulares devem ser cada vez menores frente a interconexão e igualdade dos desafios paulatinamente mais comuns entre os povos.

Assim também está a ocorrer a substituição da ideia de hegemonia pela multipolaridade. Da mesma forma, busca-se promover o respeito aos países, independente de seu tamanho e capacidade de atuação no cenário internacional, queiram ou não os autoproclamados- um gesto político cada vez mais comum infelizmente- policiais do globo existentes. Um momento histórico em que são exigidos pontes ao invés de muros, e como certa vez colocou o revolucionário chinês Sun Yat Sen: ’’A tendência do mundo avança impetuosamente. Quem seguir esta corrente prosperará e quem ficar contra fracassará.’’

Referências:

EGIDO, José Antonio. O Partido Comunista da China oferece vários ensinamentos na luta contra a pandemia. In: Revista Opera. 2020. Disponível em: https://revistaopera.com.br/2020/03/18/o-partido-comunista-da-china-oferece-varios-ensinamentos-na-luta-contra-a-pandemia/.

EMBAIXADA DA FEDERAÇÃO DA RÚSSIA NA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros da Rússia Maria Zakharova sobre a rejeição da ajuda à Venezuela pelo FMI. Trecho da conferência de imprensa realizada em 19 de março de 2020. Disponível em: https://brazil.mid.ru/pt/web/brasil_pt/noticias/-/asset_publisher/dO3SU1H2sFRf/content/porta-voz-do-ministerio-dos-negocios-estrangeiros-da-russia-maria-zakharova-sobre-a-rejeicao-da-ajuda-a-venezuelo-pelo-fmi?fbclid=IwAR2e-z4z-eKRzB8P2mKv9AvZPzyxSqBcBOuY6fUykEDoZP9af8nVFnszfic.

JINPING, Xi. A Governança da China. Editora Línguas Estrangeiras, 1º Edição, Beijing, 2014, pp. 328 e 329.

MINISTRY OF FOREIGN AFFARIS OF PEOPLE’S REPUBLIC OF CHINA. Conferência de imprensa do Porta-voz do ministério das relações exteriores. 23 de março de 2020. Disponível em:  https://www.fmprc.gov.cn/mfa_eng/xwfw_665399/s2510_665401/2511_665403/t1759985.shtml.

SPUTNIK BRASIL. OMS destaca medidas tomadas pela Rússia no combate ao coronavírus. 2020. Disponível em: https://br.sputniknews.com/russia/2020032615377526-oms-elogia-russia-por-medidas-de-combate-do-coronavirus/.

ROTHER, Larry. A Pandemia tem um culpado: A China. In: Revista Época. 2020. Disponível em: https://epoca.globo.com/larry-rohter/a-pandemia-tem-um-culpado-china-1-24315628.

XINHUA. Especialista da OMS elogia medidas da China contra COVID-19. 2020. Disponível em: http://portuguese.xinhuanet.com/2020-03/06/c_138849862.htm.

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por Anders Noren

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