As mudanças climáticas e o cinema: a ciência por trás do filme “O dia depois de amanhã”

Cena do filme “O dia depois de amanhã”. Crédito: 20th Century Fox/Business Insider.

Os períodos atuais de calor, frio, seca e enchente podem ser comparados às variações que ocorreram no passado? De que forma os ciclos naturais vão interagir no futuro com as alterações ambientais provocadas pelo homem?  Qual é a probabilidade de ocorrer um evento climático extremo, a exemplo do filme “O dia depois de amanhã” (2004), dirigido por Roland Emmerich, que mostra efeitos dramáticos da alteração do clima global?

O filme parece ter focado principalmente no evento climático conhecido como “Resposta não linear da circulação termohalina (THC) do Atlântico Norte” cujas informações consolidadas encontravam-se disponíveis em The Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC), órgão vinculado à Organização das Nações Unidas, dedicado a avaliar a ciência relacionada às mudanças climáticas, conforme descrito a seguir.

“Resposta não linear da circulação termohalina (THC) do Atlântico Norte”. Crédito: https://globe-net.com/

Resposta não linear da circulação termohalina (THC) do Atlântico Norte

Muitos estudos de modelos (revisados ​​em Weaver et al., 1993; Rahmstorf et al., 1996) analisaram a resposta não linear da circulação oceânica mundial – a chamada “correia transportadora”. Este sistema transporta calor e influencia os padrões climáticos regionais. Um componente desse sistema é a corrente no Oceano Atlântico.  As correntes quentes da superfície fluem para o norte. A liberação de calor e a evaporação da superfície do oceano diminuem a temperatura e aumentam a densidade e a salinidade da água. No Atlântico Norte, essa água mais densa afunda nos locais de convecção do Labrador e da Groenlândia e volta para o sul como águas profundas. Esse chamado THC do Atlântico Norte pode diminuir a velocidade ou até colapsar devido às mudanças climáticas.

Mudanças nas forças térmicas e de água doce podem resultar em completo colapso do THC do Atlântico Norte ou encerramento regional nos mares do Labrador e da Groenlândia. No Atlântico Sul, as águas profundas da formação da Antártica podem romper-se. Tais eventos são encontrados em registro paleoclimático, portanto são plausíveis.

As consequências para os ecossistemas marinhos e a pesca podem ser graves. A parada completa levaria a um oceano profundo estagnado, com a redução dos níveis de oxigênio em águas profundas e a captação de carbono, afetando os ecossistemas marinhos. Essa paralisação também representaria uma grande mudança na quantidade de calor e no clima do noroeste da Europa.

Mar do Labrador. Crédito: Wikipedia.

O registro paleoclimático mostra evidências claras de rápidas flutuações climáticas na região do Atlântico Norte (com possíveis conexões com outras regiões), durante a última glaciação e no início do Holoceno. Pensa-se que pelo menos alguns desses eventos – notavelmente o evento Younger Dryas, quando o aquecimento pós-glacial foi interrompido por um súbito retorno às condições mais frias dentro de algumas décadas, cerca de 11.000 anos atrás – causados ​​por mudanças na estabilidade das águas do Atlântico Norte. Essas mudanças, que são registradas nos núcleos de gelo centrais da Groenlândia e em outros lugares, foram acompanhadas por grandes mudanças no pólen e outros registros de flora e fauna na Europa Ocidental, indicando que eles tiveram efeitos generalizados no clima e nos ecossistemas regionais europeus (Ammann, 2000; Ammann et al., 2000).

A causa provável para essas flutuações são as mudanças na estabilidade do THC provocadas pelo influxo de água doce proveniente do derretimento de icebergs e / ou calotas polares. O aumento do aquecimento do efeito estufa pode produzir mudanças semelhantes na estabilidade no Atlântico Norte, devido ao aquecimento e à diminuição da sanilização das águas superficiais do Atlântico Norte. A operação atual do THC é autossustentável dentro de limites definidos por limites específicos.

Se esses limites fossem excedidos, duas respostas seriam possíveis: desligamento de um componente regional do sistema ou desligamento completo do THC. Ambas as respostas foram simuladas. Uma paralisação regional no mar de Labrador (enquanto o segundo maior local de convecção do Atlântico no mar da Groenlândia continuou a operar) foi simulada por Wood et al. (1999). O encerramento regional simulado pode ocorrer no início do século XXI e pode ocorrer rapidamente – em menos de uma década. As simulações de Manabe e Stouffer (1993) e Hirst (1999) mostram ainda mais a possibilidade de uma paralisação da formação de águas subterrâneas da Antártica, que é a segunda maior fonte de águas profundas do oceano mundial.

Mar da Groenlândia. Crédito: https://too.by/

Essas simulações identificam claramente a possível instabilidade do THC. A determinação de valores limites apropriados, no entanto, requer análise de muitos cenários e estudos de sensibilidade de importantes parâmetros do modelo. Stocker e Schmittner (1997), por exemplo, mostraram que o THC é sensível não apenas ao nível final da concentração atmosférica de CO2, mas também à taxa de variação. Rahmstorf e Ganopolski (1999) mostram que as incertezas no ciclo hidrológico são uma das principais razões para a incerteza na previsão.

Parâmetros adicionais são a sensibilidade climática (valores altos aumentam a probabilidade de uma mudança na circulação) e a taxa pré-industrial de capotagem do Atlântico (uma circulação já fraca é mais suscetível à ruptura) (por exemplo, Schneider e Thompson, 2000). Essas simulações sugerem que o aquecimento global nos próximos 100 anos poderá levar a um colapso repentino do THC décadas a séculos depois, o que levaria irrevogavelmente a grandes efeitos nas gerações futuras.

Percebe-se que no filme “O dia depois de amanhã”, o cientista palestrante baseia-se nessas mesmas simulações, ao dizer que suas previsões eram para um futuro de muitos anos à frente, como esses documentos disponíveis à época e aqui resumidos. Os possíveis impactos dessas mudanças na circulação ainda não foram estudados sistematicamente. A paralisação completa do THC representaria uma grande mudança na quantidade de calor do hemisfério norte, porque essa circulação atualmente aquece o noroeste da Europa entre 5 e 10 ° C (Manabe e Stouffer, 1988; Rahmstorf e Ganopolski, 1999).

Consequentemente, o desligamento (paralisação da corrente) levaria a uma reversão repentina da tendência de aquecimento nessa região. Os impactos de uma paralisação regional seriam muito menores, mas provavelmente ainda graves. Para o clima europeu, a perda do ramo do Mar da Groenlândia provavelmente teria um efeito muito mais forte do que a perda do ramo do Mar do Labrador, porque a extensão norte da quente corrente do Atlântico Norte depende principalmente do primeiro. Em ambos os casos, as consequências das mudanças na circulação para os ecossistemas marinhos e a pesca podem ser graves. O desligamento das principais fontes de águas profundas no Atlântico Norte e no Oceano Antártico levaria a um oceano profundo quase estagnado, com consequências ainda inexploradas (por exemplo, para níveis de oxigênio em águas profundas, captação de carbono e ecossistemas marinhos).

Nem a probabilidade e o momento de uma grande mudança na circulação oceânica, nem seus impactos podem ser previstos com confiança ainda, mas esse evento apresenta um risco plausível e não desprezível. A mudança seria em grande parte irreversível em uma escala de séculos, o início poderia ser relativamente repentino e o potencial de danos poderia ser muito alto.

Destaques do filme como legado para as gerações presentes e futuras

A narrativa do filme torna-se bastante interessante no que diz respeito à resiliência diferenciada dos personagens e aos efeitos da tragédia anunciada nos diferentes grupos sociais, como no caso do mendigo que aparece muitas vezes para mostrar como lição a grande resiliência de quem enfrenta graves adversidades no seu cotidiano. O mendigo passa a ser orientador de posturas mais adequadas para enfrentar o frio, como na sugestão que ele dá para que não se queime papéis. Por sua experiência em usar jornais como morador de rua, sabe que as folhas dos livros da biblioteca serão cruciais para aquecer o corpo do forte frio que viria a permanecer por muito tempo.

O filme insere situações ficcionais de modo muito atrativo para o expectador que teme pelo presente e pelas próximas gerações e tem dúvidas do quão seremos capazes de entender e enfrentar esse problema. Logo nas primeiras cenas, há uma palestra de um cientista para um grupo de representantes de diversos países. Há reações de alguns políticos argumentando ser impossível arcar financeiramente com o problema. Esses embates entre economia, ciência e política aparecem ao longo do filme em diversos momentos.

A tragédia anunciada no filme de que seria necessário deslocar populações inteiras do norte dos EUA e da Europa além de partes da Ásia, é muito bem realçada mostrando que gastos para prevenção são sempre muito menores do que os gastos necessários para enfrentar o problema quando já instalado. O filme enfatiza também um problema recorrente que envolve uma minoria de céticos mundiais e negacionistas da ciência do clima. À época, essa minoria obteve financiamento para campanhas difamadoras de cientistas, financiadas por grupos de empresas de combustíveis fosseis contra as evidências cientificas da elevação da temperatura média global da superfície terrestre e seus impactos. Nos dias de hoje, quinze anos após, esse tipo de ação para difamar a ciência tornou-se mais sofisticado e veloz.

Essas perguntas sobre mudanças globais do clima ainda não estão completamente respondidas, mas a maioria dos estudos vem apontando para a necessidade de articulação entre os dirigentes dos diversos países no sentido de adoção de medidas cautelosas quanto ao assunto, o que resultou na Convenção Mundial do ClimaUnited Nations Framework Convention on Climate Change (UNFCCC), ou Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, em 1992.

A UNFCCC é responsável pela política internacional do clima, que resultou em diversos acordos tais como o Protocolo de Quioto, de 1997, e o Acordo de Paris, de 2015. Anualmente há encontros dos países signatários da Convenção, nas chamadas Conference of Parties (COPs), Conferências das Partes, a última, realizada em Madri, a COP25.

O termo “precautionary investment” é utilizado para expressar tal postura cautelosa de que deve-se prevenir quanto ao problema, apesar das incertezas, principalmente pelo risco de que suas consequências sejam catastróficas. A ocorrência de elevação da temperatura da Terra e sua relação com causas antropogênicas, ou seja, causadas pelo homem, não naturais, (ver figura abaixo) apresenta evidências, segundo diversos estudos feitos sobre os últimos 100 anos, os últimos 1000 anos e os últimos um milhão de anos do clima da Terra, consolidadas pelos relatórios do Intergovernmental Panel on Climate Change – Painel Intergovernamental sobre Mudança Global do Clima (IPCC)

Crédito: IPCC 2007.

Neste gráfico, ilustra-se a comprovação da participação humana no aquecimento global. A linha preta é o “observado” que significa o que é medido, verificado por instrumentos. Os efeitos naturais somente (faixa azul) não explicam o comportamento da temperatura média da superfície terrestre (linha preta).  A faixa azul representa a modelagem somente da participação dos efeitos naturais na temperatura média da superfície terrestre. A faixa rosa representa a modelagem da junção dos efeitos naturais com os efeitos antropogênicos. Verifica-se que a faixa rosa comporta-se como a linha preta que é a linha do que é comprovado por medição.

As medições cientificas climáticas aparecem no filme em alguns momentos, como por exemplo, na cena das boias medidoras de parâmetros de temperatura dos oceanos, logo na parte inicial. Parecia que uma das boias havia tido problema, por indicar resfriamento abrupto. Isso é demonstrado no diálogo do senhor, que representa um cientista inglês do Hadley Center, com os pesquisadores do Centro de observação e monitoramento dos dados recebidos pelas boias. Mas não era defeito. Todas as outras boias começam a também apresentar uma queda na temperatura de modo brutal.

E assim começa a aventura de um evento climático extremo, de congelamento repentino de uma grande região, assim como indica o mamute que aparece na cena dos jovens visitando o Museu de História Natural de Washington.  O mamute, eles observam, encontra-se em posição de movimento natural em sua rotina e os jovens comentam que ele foi surpreendido abruptamente por um congelamento. Mal imaginavam que aconteceria o mesmo com eles logo em seguida. Um outro exemplo de medição de parâmetros climáticos históricos apresentado pelo filme é o registro de gelo. Há uma cena eletrizante, na qual o ator principal salva-se de um desastre no momento em que trabalha com colegas de pesquisa, eles parecem usar uniforme do National Oceanic and Atmospheric Administration – US Department of Commerce (NOAA).

Crédito: NOAA.

Esse desastre ocorre durante uma expedição experimental que perfura camadas de gelo bastante espessas para analisar as composições das atmosferas em tempos muito remotos e é base de muitos experimentos e informações do que sabemos sobre o clima global. É bom observar que a rachadura que aparece no solo congelado no filme não tem relação alguma com a perfuração para o experimento e sim com o evento extremo que o enredo do filme abordaria nas cenas que se seguirão.

O painel cientifico IPCC auxilia a UNFCCC para suas tomadas de decisão. O primeiro Relatórios do IPCC foi lançado em 1990, o segundo em 1995, o terceiro em 2001, o quarto em 2007, o quinto em 2014 e o sexto será finalizado em 2021. Os 3 principais Grupos do IPCC são o Grupo I – Ciência do Clima; Grupo II – Vulnerabilidade, Impactos e Adaptação e Grupo III – Mitigação. O grupo I trata da ciência da atmosfera e sua interação com oceanos e a superfície terrestre, buscando identificar e registrar a mudança global do clima e suas causas. O grupo II diz respeito aos estudos sobre a vulnerabilidade à essa mudança global do clima, sobre seus impactos e sobre as propostas de adaptação a esses impactos. O grupo III – Mitigação diz respeito aos estudos para a redução do problema das mudanças climáticas globais.

Participantes da conferência de imprensa para lançar o Relatório de Síntese do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), incluindo o secretário-geral da ONU (centro) Ban Ki Moon e o presidente do IPCC, Rajendra Pachauri. Copenhague, Dinamarca (2 de novembro de 2014). Crédito: Amanda Voisard/UN Photo.

Majoritariamente, são estudos para a redução da concentração de gases de efeito estufa na atmosfera, principalmente o dióxido de carbono. Essa concentração de gases é agravada pela economia mundial desde o início da Revolução Industrial no século XVIII, baseada na queima de carvão mineral e, posteriormente, também na queima de petróleo e derivados. Um número menor de pesquisas envolve estudos sobre tecnologias que não resolvem as causas antropogênicas das emissões de gases de efeito estufa.

São propostas de mitigação em larga escala, que receberam o nome de Geo-engenharia, tais como fertilização de oceanos, Solar Radiation Management (SRM), reflexo de luz solar, e vulcões artificiais para resfriamento artificial da atmosfera, além do Carbon Capture and Storage, Captura e Armazenamento de Carbono (CCS). O CCS envolve armazenamento geológico (já há pesquisas piloto em poços de petróleo, minas de carvão e aquíferos salinos); Armazenamento químico e Armazenamento biológico. Todas essas propostas resultam em grandes impactos ainda não totalmente mensurados e implicam em não atuar nas causas do problema.

Histórico do Efeito Estufa como Questão Global

O efeito estufa foi observado, pela primeira vez, por Jean Baptiste Joseph Fourier, durante a Revolução Francesa, século XVIII. Fourier foi o primeiro a conceber a Terra como uma estufa gigante, viabilizando a vida de plantas e animais na superfície da Terra. Em 1896, Svante Arrhenius criou um modelo para estudar a influência do gás carbônico residente na atmosfera sobre a temperatura da Terra. Arrenius usou as medições de emissão de calor no espectro lunar, realizadas por Samuel P. Langley, para calcular os coeficientes de absorção de H2O e CO2, pontos chave para a construção do modelo que concebera.

As causas das Eras Glaciais, atual objeto de estudo em alguns centros de pesquisa, como o Stockholm Physics Society, era uma das perguntas que Arrenius buscava responder. Os experimentos de Arrenius foram muito bem-sucedidos e seus resultados, têm sido comprovados por modernas simulações de computador. Os gases de efeito estufa, chamados por Arrenius de “hothouse gases” e não “greenhouse gases”, como nos dias de hoje, devem ser estudados em conjunto com os “aerossóis” que são outras substâncias ativas radiativamente e emitidas antropicamente à atmosfera, com efeito de resfriamento, contrário ao dos Gases de Efeito Estufa (GEE).

A ciência da atmosfera é considerada por alguns autores como a mais completa para a compreensão do conceito de Sistema Terra por envolver a história da formação e evolução da atmosfera do planeta, além da biologia, da geologia, e da hidrologia. Efeito estufa é um termo usado para nomear um possível aquecimento global do planeta. A visão dominante entre os cientistas estudiosos do clima é que ocorre um aquecimento global no século XX e o mesmo tem sido causado, em parte, por emissões antrópicas de gases, como o dióxido de carbono, que retém calor e, em excesso, provocam o efeito estufa.

Entretanto, apesar de minoritárias, algumas dúvidas de caráter científico ainda envolvem o assunto. Grupos de estudiosos divergem, entre outras coisas, quanto à própria existência ou importância do incremento do referido fenômeno climático de aquecimento global. É o caso de alguns pesquisadores do Lamont-Doherty Earth Observatory da Universidade de Columbia. Estes afirmam que surtos seculares de frio, similares à chamada pequena era glacial, vêm ocorrendo com certa regularidade, mais ou menos a cada 1450 ou 1500 anos, e que no fim do século XIX e início do século XX, a temperatura voltou a subir cerca de 0,46 graus, sugerindo que o mundo esteja no início de um longo ciclo secular de aquecimento natural. Pesquisadores do Woods Hole Oceanographic Institute de Massachussets, ao contrário, dizem que tais variações não são tão simples de serem determinadas.

Ou seja, não seriam variações perfeitamente periódicas, impossibilitando que se saiba realmente onde nos situamos no detalhamento destes períodos. Um outro grupo de pesquisa, o National Oceanic and Atmospheric Administration’s Geophysical Data Center, do Colorado, argumenta que, mesmo que o mundo esteja no início de um aquecimento natural, qualquer emissão de gases que causem o efeito estufa deve ser vista como problema adicional, pois provocaria uma elevação ainda maior das temperaturas, devendo-se adotar uma postura de prevenção.

As discussões quanto às causas do aquecimento do clima envolvem, ainda, algumas dúvidas, que incorrem em questões políticas. Além das dúvidas no que se refere às responsabilidades diferentes de cada país ou grupos de países, um dos assuntos mais importantes diz respeito à diferença de ênfase dada às causas. Alguns estudos, majoritariamente advindos dos países desenvolvidos, enfatizam que as emissões de gases de efeito estufa ocorridas no presente estão acelerando-se nos países em desenvolvimento e este seria o ponto central a ser focado.

Outros estudos enfatizam a importância da concentração desses gases para o entendimento do processo de aquecimento do clima, o que envolve uma análise histórica do desenvolvimento econômico desses países. A permanência desses gases na atmosfera é de muitos anos. Considera-se, por exemplo, que o dióxido de carbono emitido permanece, em média, 140 anos na atmosfera. Segundo Seinfeld e Pandis, no entanto, este tempo é de 200 anos, estimativa que combina o tempo de vida deste gás na atmosfera, na biosfera e nos oceanos.

Um outro gás de efeito estufa, o SF615, possui potencial de aquecimento global cerca de 24900 vezes maior do que o potencial de aquecimento global do CO2 e seu tempo de vida é de 3200 anos. Não há maiores restrições ao seu uso porque é produzido em pequenas quantidades, apesar de seu consumo nacional crescer à taxa anual de 8%, principalmente para a produção de equipamentos elétricos de alta capacidade e desempenho, além de mais compactos, leves e seguros.

Disjuntores e subestações blindadas que foram desenvolvidos a partir do SF6 têm a vantagem de utilizar cerca de 10% do espaço físico das subestações convencionais equivalentes. Além disto, o SF6, juntamente com os HFCs e os PFCs, são alternativas importantes na substituição de produtos químicos prejudiciais à preservação da camada de ozônio16. Entre as principais aplicações estão a refrigeração, os sistemas de ar condicionado, a extinção de incêndios, aerossóis, solventes e produção de espumas.

As mudanças climáticas globais envolvem causas naturais e causas antropogênicas, objeto de debate internacional desde a década de 1980. As incertezas científicas e as diferentes visões sobre as causas e sobre a própria existência de um aquecimento global têm sido objeto de importantes debates no Brasil e no mundo. No entanto, cada vez mais tem sido constatada a relação entre aquecimento global do clima e atividades antrópicas (humanas), principalmente devido ao uso de fontes de energia com base em combustíveis fósseis.

Por conseguinte, existe uma maior cobrança da sociedade por um desenvolvimento socioeconômico com redução de emissões de gases de efeito estufa atrelado ao uso de fontes alternativas de energia. Entretanto, sabe-se que existe um período de transição necessário para a passagem do uso de fontes fósseis para o uso de novas fontes de energia. O desenvolvimento econômico com menor emissão de carbono envolve uma complexa rede de atores, tais como governos, empresas públicas, empresas privadas, sociedade civil, academia e instituições não governamentais.

A composição de 99% da atmosfera terrestre é predominantemente de nitrogênio (N2), oxigênio (O2) e argônio (Ar). Se houvesse apenas estes três gases na atmosfera, a temperatura média da Terra seria inferior a zero graus centígrados e os oceanos estariam congelados. Entretanto, a presença de outros gases (1%) impede parte da transmissão do calor da atmosfera para o espaço exterior, aumentando sua temperatura. Este controle natural da temperatura terrestre é conhecido como efeito estufa.

Os gases responsáveis por esse efeito são denominados gases de efeito estufa – GEE. Estes geralmente são compostos de moléculas que se encontram naturalmente na atmosfera e os mais importantes são: dióxido de carbono (CO2); vapor de água (H2O); metano (CH4); ozônio (O3) e óxido nitroso (N2O). Quanto maior a concentração dos GEE, maior é a absorção de calor e maior será o aquecimento da atmosfera. O efeito estufa existe a bilhões de anos, possibilitando a vida terrestre na forma conhecida. Caso não existisse o efeito estufa natural, a temperatura média da superfície da Terra situar-se-ia na faixa de -18oC. A temperatura média global da superfície da Terra com a presença do efeito estufa é de aproximadamente 15o C .

O vapor d’água é o maior responsável pelo efeito estufa devido à sua abundância e o dióxido de carbono – CO2 – é o segundo em importância, sendo emitido na atmosfera de maneira natural (por exemplo, vem sendo lançado de maneira natural pelos vulcões ao longo da história da Terra) e não natural – antropogênico. O efeito estufa começou a alarmar a comunidade científica, porque o rápido aumento das concentrações dos GEE devido às emissões antropogênicas está intensificando o efeito estufa.

O aumento da concentração de CO2 na atmosfera coincide com a industrialização da sociedade e existem boas evidências para indicar que é causada pelas emissões crescentes de CO2 das atividades humanas. As concentrações presentes são maiores que as dos últimos 420.000 anos e provavelmente maiores que as dos últimos 20 milhões de anos. O contribuinte mais importante para o aumento dos estoques de CO2 atmosférico é a queima de combustíveis fósseis (por exemplo, motores a combustão) e a mudança no uso da terra atualmente nos trópicos e nos séculos XVIII e IXX nos países do hemisfério norte.

Nos últimos 150 anos, as concentrações de CO2 aumentaram cerca de 31% desde 1750; as concentrações de metano (CH4) mais que dobraram e as concentrações de óxido nitroso (N2O) aumentaram cerca de 15%. Além disso, gases artificiais, com a mesma propriedade, passaram a intensificar o efeito estufa: hidrofluorcarbonos (HFCs), perfluorcarbonos (PFCs), hexafluoreto de enxofre (SF6), clorofluorcarbonos (CFCs) e hidroclorofluorcarbonos (HCHFCs) (IPCC, 1996). Este fenômeno também é conhecido por aquecimento global.

Em resposta às diversas evidências científicas sobre a possibilidade de aquecimento global, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Organização Meteorológica Mundial (OMM) criaram em 1988 o Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima – IPCC. O IPCC é o órgão responsável em fornecer informações sobre a ciência, os impactos e a economia, além de opções para mitigação e adaptação, da mudança do clima. O trabalho do IPCC representa o consenso da comunidade científica na ciência da mudança do clima. Ele é reconhecido como a fonte mais confiável de informação sobre mudança do clima e suas causas. Seus métodos de obtenção de consenso são endossados por várias academias de ciência mundiais.

Nos próximos anos, podem ocorrer mudanças climáticas regionais, incluindo temperaturas elevadas, invernos mais quentes, um ciclo hidrológico global médio exacerbado, alterações na biodiversidade e no ciclo de carbono, aumento a média do nível dos mares, devido à expansão termal dos mares e ao derretimento de geleiras e placas de gelo. Existem questões relativas à mudança do clima no que se refere à escala dos impactos regionais e às consequências para a sociedade no próximo século. Porém, as implicações da mudança do clima e sua mitigação são claras em termos de padrões de consumo e desenvolvimento, na medida em que a industrialização processou-se com base na queima de combustíveis fósseis. O tema é necessariamente global, uma vez que a atmosfera pertence a todos, os impactos atingem todo o planeta e o acesso a recursos vitais como água e energia tornam-se cada vez mais escassos.

Aquecimento global e derretimento de geleiras

A água representa 71% da superfície da Terra, sendo aproximadamente 97,5% de água salgada e 2,5% de água doce. A água doce encontra-se majoritariamente em estado sólido – cerca de 2/3 em geleiras e calotas polares. Dos 1/3 restantes de água doce, em estado líquido, a maior parte encontra-se em subterrâneos, restando cerca de 0,26% de toda a água potável em rios, lagos e lençóis freáticos menos profundos.

O aquecimento global já resulta em redução de áreas de água doce congelada. Pesquisadores do Serviço Mundial de Vigilância dos Glaciários, na Suíça, por exemplo, já registraram uma diminuição do continente antártico, que tem decrescido em ritmo uniforme nos últimos anos. No entanto, esses estudos encontram-se em fase de comprovação científica, sendo mais evidente a redução de gelo no Ártico.

Fatores naturais e antropogênicos da mudança do clima

É importante separar os fatores naturais e antropogênicos das mudanças climáticas globais para buscar soluções compatíveis com as respectivas causas. A atual preocupação científica com os impactos do aquecimento global envolve amplos e complexos aspectos, tais como a mudança de salinidade e temperatura dos oceanos, impactos na biodiversidade e elevação dos níveis dos mares.

Outro tipo de preocupação é relativo a efeitos indiretos, como a enorme quantidade de carbono contido em áreas congeladas que tende a ser liberada em forma de gás pelo fenômeno de degelo. As emissões desses gases resultariam em um aumento adicional da concentração de carbono na atmosfera.

É importante ressaltar que somente em casos de degelo de áreas continentais, haveria aumento do nível do mar. No caso de degelo de água de blocos que não se encontram sobre continentes, como é o caso de icebergs, não há impacto na elevação do nível do mar. O fenômeno de degelo deve ser analisado principalmente pelos eventos naturais.

É importante separar os fatores naturais e antropogênicos das mudanças climáticas, de modo a propor corretamente ações para correção dos problemas. Além das mudanças climáticas originadas pela ação do homem, existem aquelas que são causadas pela própria natureza, mas que podem serem agravadas por ações humanas.

Quatro são os tipos de fenômenos naturais importantes relacionados às mudanças climáticas globais com base em publicação do INPE/Agência Espacial Brasileira – Coleção Explorando o Ensino Volume 13. Mudanças Climáticas. Brasília 2009

Mudanças de configuração dos continentes

Em 1912, Alfred Lothar Wegener publicou um trabalho sugerindo que há cerca de 200 milhões de anos todos os continentes estariam reunidos em um só bloco chamado Pangea e cercado por um imenso oceano chamado Panthalassa. Segundo essa teoria, com o passar do tempo, foi ocorrendo uma alteração desse padrão dos continentes até chegar ao que existe hoje e que continua se movimentando lentamente. Nesse processo, como os continentes ocuparam posições diferentes na superfície da Terra, a distribuição das zonas climáticas e a circulação oceânica eram diferentes no passado. Tais variações são da ordem de milhares de anos.

Teorias da evolução estelar

Algumas teorias da evolução estelar sugerem que o Sol teria sido “mais fraco” nos primeiros bilhões de anos da história da Terra. Todavia sabe-se que o planeta não estava frio, pois, possivelmente, havia um forte efeito estufa que compensava a reduzida radiação solar.

Teoria de Milankovitch

Variações na órbita da Terra e as consequentes variações da quantidade de calor recebido influenciaram na determinação das variações climáticas do passado. Com a variação da radiação solar por motivos astronômicos há uma variação no volume de gelo e, consequentemente, na temperatura global.

A teoria matemática do clima, baseada nas variações sazonais e latitudinais da radiação solar recebida pela Terra é conhecida como a Teoria de Milankovitch, descoberta pelo sérvio Milutin Milankovitch no início do século XX. A teoria de Milankovith está baseada nas variações cíclicas de 3 elementos que ocasionam variações da quantidade de energia solar que chega a Terra. São eles:

 -Precessão

As mudanças na orientação do eixo rotacional da Terra em relação ao Sol alteram os meses das estações do ano (verão, outono, inverno e primavera) em um determinado hemisfério. Este processo tem um período de cerca de 20 mil anos.

– Mudanças na Obliquidade

Trata-se de mudanças na inclinação do eixo de rotação da Terra. Quando a inclinação é maior, os invernos são mais frios e os verões são mais quentes. E quando a inclinação é menor, as estações são mais suaves. Atualmente a inclinação é de 23,5o , mas a mesma pode variar entre 21,5 o e 24,5 o . O período de mudança de inclinação do eixo de rotação da Terra é de cerca de 40 mil anos. 

– Variação na Excentricidade

A excentricidade está relacionada com a órbita da Terra em relação ao Sol. A órbita pode ser mais “elíptica” ou mais “circular”. Quando a órbita está mais “elíptica”, há maior diferença da insolação entre os meses de janeiro e julho. O período da variação na excentricidade é de cerca de 100 mil anos.

Os aerossóis

Os aerossóis são partículas em suspensão na atmosfera, tais como poeira ou pólen. A maior parte dos aerossóis tem origem natural, produzidos principalmente por vulcões, pela queima natural da vegetação e pela ação do vento sobre a superfície do mar e sobre áreas de solo descoberto. Os aerossóis têm um papel muito importante no balanço de energia, pois podem absorver e refletir radiação. Por terem uma alta importância na formação de nuvens, os aerossóis também influenciam indiretamente o balanço de energia na atmosfera. Isto porque as nuvens são muito eficientes como corpos que refletem a radiação solar de volta para o espaço. Nuvens formadas em altas concentrações de aerossóis tendem a apresentar gotas mais numerosas e, consequentemente, menores. Estas refletem mais radiação solar do que as nuvens formadas por gotas maiores e menos numerosas.

As erupções vulcânicas produzem os maiores impactos relacionados aos aerossóis na atmosfera, emitindo globalmente bilhões de toneladas de aerossóis por ano. Em certos casos, estes aerossóis atingem camadas muito altas, podendo persistir por longos períodos. O vulcão Pinatubo nas Filipinas lançou na atmosfera, em 1991, uma grande quantidade de enxofre que eventualmente se converteu em aerossóis de sulfato. Devido às características desse tipo de aerossol, estima-se que houve uma diminuição de cerca de 0,6°C da temperatura média global, após 2 anos do início de sua atividade.

Alterações nos ciclos de carbono e da água

Um dos problemas decorrentes do degelo recentemente observado é a alteração dos ciclos do carbono e da água, além de outros ciclos importantes para o equilíbrio do sistema terrestre. Os ciclos de carbono e de água permitem que respiremos e que haja nosso tipo de vida no planeta Terra. A relação do ciclo da água com o do carbono permite a produção de (O2) , oxigênio: [CO2 + H2O + energia solar = CH2O + O2]

O Carbono é o elemento da tabela periódica mais importante para a estrutura dos seres vivos. O ciclo do carbono envolve as diversas transformações que ele sofre ao longo do tempo. É o motor químico que fornece energia e massa à maior parte dos seres vivos, além de estar intimamente relacionado com a regulação da atmosfera global e, consequentemente, com o clima.

Até antes da revolução industrial, o ciclo de carbono estava equilibrado, ou seja, o que era absorvido pelo solo e pelo oceano era equivalente ao que era emitido pela atmosfera. Com a industrialização e a intensificação da queima de combustíveis fósseis pelas atividades humanas, a emissão de gás carbônico para a atmosfera tornou-se maior que a capacidade natural de absorção.  Ou seja, o carbono que estava armazenado no solo e nos oceanos durante milênios, passa a ser jogado pelas atividades humanas de volta para atmosfera em um espaço de tempo muito curto, impossibilitando que o ciclo natural o traga de volta para os reservatórios. O ciclo de carbono pode ser dividido em duas partes, o ciclo terrestre e o ciclo marinho.

No ciclo terrestre, as plantas removem gás carbônico da atmosfera através da fotossíntese. Parte desse carbono é utilizada pela planta para a sua manutenção, fazendo parte do corpo da planta (folhas, galhos, troncos e raízes). Outra parte é liberada como gás carbônico para a atmosfera.

Quando as plantas servem de alimento para animais herbívoros, ou morrem e apodrecem, o carbono passa para os micro-organismos ou animais que as ingeriram como fonte de energia para a construção e manutenção dos seus corpos. Neste processo, também liberam gás carbônico para a atmosfera, através da respiração.

Parte do carbono que flui através dos ecossistemas terrestres vai para o solo, na forma de restos de plantas, animais e cinzas de incêndios, todos resistentes à decomposição. Embora a entrada de carbono no solo seja bastante pequena, a saída também é pequena, o que faz com que o solo seja o maior reservatório de carbono nos continentes.

As florestas do planeta têm importância fundamental no ciclo do carbono e da água. A mudança de uso do solo após a Revolução Industrial, diz respeito a alterações resultantes de atividades humanas, as quais reduziram em muito a cobertura florestal do planeta. Entre 1700 e 1990, foram perdidas imensas áreas florestais em todo o globo terrestre para atender demandas da industrialização em curso.

Na ilustração está comparado o mapa de cobertura florestal do ano de 1700 com o de 1990, ou seja, 290 anos após. A área desmatada nesse período concentra-se principalmente nos países definidos como “desenvolvidos”. Os países definidos como “em desenvolvimento” apresentam nessa ilustração as suas florestas e outros biomas melhor preservados. Entretanto, após 1990, apresentam desmatamento acelerado e preocupante seguindo padrões de produção e consumo deletérios.  As áreas de cor “vermelha” representam as áreas que foram desmatadas no período, para atividades de agricultura. A cor marrom/bege representa áreas desmatadas para pastagens. (ilustração a seguir)

Palestra “Ethical issues entailed by the forest agenda in the Bali Roadmap”, realizada em Poznan na Polonia. Por Maria Silvia Muylaert de Araujo. Crédito: IVIG/COPPE/UFRJ.

Ciclo marinho de carbono

O ciclo marinho de carbono dá-se basicamente pelas trocas de gás carbônico entre a atmosfera e os oceanos através de um processo químico denominado “difusão”. Através desse processo, quando a temperatura do oceano é baixa, ocorre a captura de gás carbônico da atmosfera para o oceano. Quando a temperatura é alta, ocorre a liberação do gás carbônico do oceano para a atmosfera.

Essa característica é contrária ao do ciclo terrestre do carbono, no qual as maiores taxas de captura de gás carbônico atmosférico estão nas florestas das regiões tropicais mais quentes. No caso do ciclo do carbono nos oceanos, as maiores taxas de captura concentram-se nos mares frios das regiões temperadas.

Uma vez no oceano, o carbono capturado na superfície pode ser lentamente transportado por gravidade e pelas correntes para as camadas mais profundas. Pode ainda ser absorvido pelo fitoplâncton através da fotossíntese. Posteriormente, o carbono do fitoplâncton desloca-se para as profundezas, quando o fitoplâncton morre ou é consumido por outro animal que posteriormente também irá morrer. No oceano, o tempo de residência do carbono varia de décadas a milênios, o que faz dele o maior reservatório de carbono do planeta.

Crédito: https://pt.slideshare.net/camargolucy/ciclo-do-carbono-e-mudanas-climticas

Impactos ambientais e socioeconômicos da mudança do clima

Os cenários projetados pelo IPCC para este século indicam que a temperatura média do planeta continuará subindo e as projeções indicam um maior número de dias quentes e ondas de calor em todas as regiões continentais. Além disso, dias com geadas e ondas de frio podem ser menos frequentes.

Pode haver um aumento da frequência e da intensidade da precipitação em diversas regiões, sobretudo na região tropical. Há projeções de secas generalizadas em regiões continentais durante o verão. Muitos modelos mostram um aumento da temperatura da superfície do mar no Oceano Pacífico Equatorial, o que sugere uma situação futura de El Niño quase permanente.

De acordo com os modelos do IPCC, a retração geral dos glaciares e capas de gelo continuará durante o século XXI e a capa de neve e o gelo marinho do Hemisfério Norte continuará diminuindo. Entretanto, há um amplo consenso de que é pouco provável que, durante o século XXI, ocorra perda de gelo continental antártico que determine um aumento mais importante do nível do mar por essa causa específica (degelo continental antártico). Há, no entanto, controvérsias a esse respeito.

As mudanças climáticas provocadas pelo aquecimento da Terra podem ter efeitos devastadores em escala global. Ilhas tropicais e geleiras nos Alpes poderão desaparecer, aumentarão as ocorrências de inundações ou secas, a produtividade agrícola tenderá a diminuir e haverá o degelo do permafrost, a capa do subsolo de regiões frias. Estão previstas maiores ocorrências e intensificação de eventos climáticos extremos, alterações nas populações e disponibilidade geográfica de espécies de mamíferos, invertebrados, répteis, anfíbios e insetos. Estima-se também que as alterações do clima alterarão os padrões de cobertura de nuvens e os padrões de vento.

O aumento do nível do mar pode afetar a oferta de água doce nos aquíferos costeiros, que podem ser salinizados pela invasão de água do mar. O significado econômico da elevação do nível médio relativo do mar é significativo. Há previsão de consequências para a pesca, agricultura, navegação, lançamento de efluentes, proteção costeira, produtividade biológica e biodiversidade.

Os oceanos têm papel vital no ciclo da água. Eles funcionam como reguladores do clima global através de fluxos entre a água, a atmosfera da terra e a vegetação terrestre. Os oceanos participam do fluxo de CO2, com absorção de cerca de 30% do CO2 emitido por fontes antrópicas.

Crédito: Nasa Climate Kids.

As mudanças do clima, incluindo o degelo, podem, além de levar a mudanças da temperatura da água do mar, levar a alterações nos padrões de circulação do oceano, na mistura vertical das águas e nos padrões de ondas. Consequentemente, pode haver impactos sobre a produtividade biológica do oceano, a estrutura ecológica de algumas regiões e a disponibilidade de nutrientes.

É importante ressaltar que a maioria dos gases do efeito estufa tem vida longa na atmosfera até serem removidos. Modelos climáticos globais mostram que, mesmo que as concentrações destes gases na atmosfera fossem mantidas constantes nos valores atuais, as temperaturas continuariam a subir por mais de 200 anos e o nível do mar, por mais de um milênio.

Sabe-se, também, que o aquecimento global provocará derretimento das calotas polares, contribuindo com o aumento do nível médio do mar e inundação de regiões mais baixas. A evaporação nas regiões equatoriais aumentará e, com isto, os furacões e tempestades tropicais deverão ficar mais ativos. Além disso, é previsto aumento da incidência de doenças tropicais, tais como malária, dengue e febre amarela.

No filme, são mostrados diversos eventos extremos ao mesmo tempo, tais como em uma cena muito impactante na Califórnia com vários furacões e destruição de diversas áreas repentinamente. Também é mostrado o congelamento repentino de hélices de helicópteros e de pessoas assim como de ecossistemas inteiros. Há um paralelo interessante com o mamute de tempos históricos que aparece na cena no Museu de História Natural. Podemos também observar a cena do navio passando em frente à biblioteca pública onde se abrigam muitas pessoas, como demonstração de possível rompimento de diques e aumento do nível das águas invadindo a cidade. 

Ecossistemas costeiros e ribeirinhos em áreas sob influência das marés poderão ser profundamente alterados, com uma rápida elevação do nível do mar. A agricultura e a geração de hidroeletricidade também poderiam ser afetadas por mudanças na distribuição das chuvas, na ocorrência de períodos secos extensos, ou impactos de áreas por degelo.

Mais de 24 milhões de km3 de água congelada encontram-se na Antártica, Groenlândia, Ártico, montanhas e solos congelados. Representam menos de 2% da água total no planeta, mas precisam manter o equilíbrio necessário, para que o planeta continue como o conhecemos. No gelo, habitam inúmeras espécies animais: ursos, focas, pinguins. Baleias alimentam-se nos mares gelados dos polos. A vida floresce no gelo. O gelo equilibra a vida no planeta. Mas o aquecimento global derrete o gelo, destrói habitats e espécies. O gelo reflete os raios solares e, sem ele, o efeito estufa aumenta, em um círculo vicioso, onde menos gelo gera mais calor e mais calor reduz o gelo.

A água do mar expande-se com o calor e ocupa mais espaço. Quanto maior a temperatura, maior o risco de os blocos continentais de gelo deslizarem para o oceano, elevando o nível do mar. Cidades inteiras nas zonas costeiras de todo o mundo podem ser afetadas.

A água doce do degelo misturada à salgada pode mudar a temperatura e os padrões de circulação do oceano. A temperatura amena do Norte trazida pelas correntes marinhas pode ser em muito reduzida. O degelo pode provocar a liberação de gases de efeito estufa estocados sob suas camadas por muito tempo, agravando o aquecimento global.

Catástrofes naturais como as ocasionadas por tsunamis deixam elevados números de mortos e desaparecidos, além de incalculáveis prejuízos sócio-econômicos e ambientais, realçando a vulnerabilidade existente no presente para enfrentamento de catástrofes. Cabe ressaltar que diversos eventos naturais como tsunamis não têm relação de causa e efeito com as mudanças climáticas globais, mas expõem a vulnerabilidade de um sistema para reagir a desastres.

É importante que haja propostas envolvendo todos os setores sociais para responder aos impactos do fenômeno da alteração do clima em escala global. A medida mais eficiente para enfrentar os impactos de desastres naturais é a adoção de medidas preventivas.

As medidas de cunho corretivo, como as obras de engenharia, costumam ser mais caras e paliativas. O grande desastre desencadeado pelo Furacão Katrina, por exemplo, em New Orleans, USA, foi causado pelo rompimento dos diques que haviam sido construídos para resistirem a furacões de categorias menos graves do que o Katrina.

Entre outras ações, é fundamental frear o aquecimento global e limitar o aumento da temperatura média global da superfície terrestre até 2º. C até 2100, relativamente ao período anterior à Revolução Industrial. O ciclo natural da água, existente por bilhões de anos, garante o volume de rios, lagos e lençóis freáticos pelas chuvas provenientes da evaporação dos mares.

Aumento de volume de chuvas e Intrusão Salina

A oferta de água doce nos aquíferos costeiros pode ser afetada pelo aumento da frequência de chuvas e pela elevação do nível do mar, causando salinização devido à invasão de água marítima. O movimento da frente de água salgada em estuários poderá levar a necessidade de transferência geográfica de bombas de águas doce para regiões mais afastadas da costa, com consequências sobre a disponibilidade de água, seu custo, a agricultura costeira, sistemas sanitários e de esgoto. Algumas tempestades no Brasil foram identificadas como advindas de eventos climáticos extremos tais como tempestades em Santa Catarina nos anos 2000. 

Finalmente, o filme alerta para uma dimensão ética bastante importante da sociedade como um todo, que são as mudanças climáticas globais. É lúdica a parte final do filme que mostra a importância de abertura das fronteiras do México para os norte-americanos. Abrem-se fronteiras para receber os norte-americanos que se salvaram do frio abrupto e buscaram, a pé, áreas mais quentes do planeta. Com isso, o filme traz uma narrativa de inversão do fluxo migratório atual de mexicanos em busca de uma vida melhor nos EUA, com inúmeros problemas de acolhimento e rejeição social nos EUA. E traz uma espécie de acerto de contas com requintes de dignidade, altivez e mensagem de solidariedade e humanidade acima de tudo.

O filme trata de modo ficcional uma parte da ciência do clima, mas que faz parte de estudos de científicos e para a qual precisamos estar preparados. Os eventos abordados no enredo já foram encontrados em registro paleoclimático sendo, portanto, plausíveis. O filme mostra que o enfrentamento do aquecimento global envolve muito esforço de todos e necessidade de postura preventiva.

Maria Silvia Muylaert de Araujo 

Membro do Painel de especialistas em vulnerabilidade de megacidades, estudo de caso do Rio de Janeiro, patrocinado pelo Global Opportunities Fund Climate Change and Energy Programme (GOF-UK). Foi Professora do MBE da COPPE/UFRJ, do MBE em Sustentabilidade do Instituto de Economia/UFRJ, e do curso Energia e Meio Ambiente da FGV/RJ. Pós graduação no Institute for Housing and Urban Development Studies, IHS, Roterdã, Holanda. DSc pelo PPE/COPPE/UFRJ. Membro do Collaborative Program of the Ethical Dimensions of Climate Change, coordenado pelo Rock Ethics Institute da Penn State University. Consultora de diversos projetos relativos a mudanças climáticas para o PNUD/UNESCO, MCT, ANEEL, IISD. Lead author do IPCC/AR6/WG2/Chapter18 a ser finalizado em 2021, Lead author do IPCC/AR5 / GT III Chapter 4. Arquiteta/urbanista pela FAU/UFRJ. MSc pelo IPPUR/UFRJ

Edição e pesquisa de vídeos/imagens: Alessandra Scangarelli Brites

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