
Há quem diga que o dia a dia não é fonte inspiradora; que o cotidiano e a rotina acabam sendo reais limitadores da criação, da inspiração. Há quem acredite que a capacidade de criar seja apenas para alguns, especialmente quando se referem às denominadas obras primas. Contudo, o que é arte e quem pode defini-la são questões que refletem uma tentativa de impor regras e limites à inspiração e criação das pessoas. Na contramão destes debates estão formas artísticas antigas como o Haicai e o Hai-Ga.
Integrantes de uma longa tradição cultural japonesa, o Haicai e o Hai-Ga, na essência, trazem em sua simplicidade a possibilidade de registrar momentos específicos da vida, sendo acessíveis a todos que queiram explorá-las. O Haicai é um gênero de poesia com forma fixa. Possui três versos, tendo o primeiro e o terceiro cinco sílabas e o segundo sete. Já o Hai-Ga consiste na união do texto de Haicai à imagem fotográfica.
Nesta última sexta-feira, o Instituto Cultural Brasil-Japão (ICBJ) realizou a 1ª Exposição Itinerante destas tradições culturais japonesas, denominada “O direito à arte: dois juristas e o pensamento sobre o Japão”. Com a presença e o apoio do Consulado Geral do Japão, na figura do cônsul Ken Hashiba, a abertura do evento trouxe ao público do Rio haicais escritos pelo ex-ministro do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) Massami Uyeda e registros fotográficos (Hai-Gas), realizados pelo próprio jurista e pelo advogado/artista Bruno Silvestre, membro da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro (OAB-RJ). A curadoria foi realizada pela artista e professora Thaís Silvestre e a direção geral por David Leal, diretor artístico do ICBJ-RJ.

“Esta exposição nasceu de uma conversa que tive com Bruno após uma live sobre questões jurídicas. Naquela oportunidade, ambos descobrimos que tínhamos em comum o gosto por estas formas de arte. Elas consistem em captar o sentimento de um determinado momento e registrá-lo em palavras e imagens. Todos vamos perecer um dia, mas estas reflexões vão ficar. A fotografia é a captação de um momento que não volta mais. As pessoas que vierem conhecer o trabalho terão uma oportunidade de constatar que tudo é possível e que todos nós temos um dom, um simples sentimento a ser expresso”, argumentou o ministro Uyeda em entrevista à Intertelas.
Ainda, segundo o jurista, o Hai-Ga está sendo aos poucos redescoberto e a iniciativa do ICBJ, com a primeira exposição de Hai-Ga no Brasil, pretende ainda resgatar esta forma de arte e levá-la ao conhecimento de um público mais amplo e, quem sabe, conquistar novos adeptos. Conforme o também coordenador geral da exposição Bruno Silvestre, a iniciativa é uma forma de troca no contato entre brasileiros, japoneses e nipo-brasileiros. De acordo com ele, suas fotografias são provenientes de duas viagens pelas principais ilhas do Japão. Sendo um deficiente visual, o fotógrafo tem baixa visão, as lentes das câmeras têm um papel especial em sua trajetória artística.
“As lentes da câmera enxergam aquilo que eu não consigo a olho nu. Então, a minha arte mostra o que eu gostaria de ver. As lentes são minhas amigas e me auxiliam a ver o mundo. A minha parte foi apresentar um olhar mais interno do Japão, de localidades pouco conhecidas do país. Já o ministro traz o Haicai e o Hai-Ga, que pratica em seu cotidiano. Tanto uma, quanto a outra podem ajudar no autoconhecimento de uma pessoa, ou até na descoberta de uma nova forma de arte. É preciso salientar que você não precisa ser uma pessoa de amplo conhecimento para expressar o seu interior”, concluiu Silvestre. Em fevereiro de 2023, a exposição irá para o Consulado Geral do Japão no Rio, no bairro do Flamengo, e, posteriormente, terá passagem pelas escolas públicas da capital.
Assista à abertura da exposição no vídeo abaixo
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