
Byung-Chul Han tem uma grande capacidade de entrar nas profundezas da psicologia social, com aguda capacidade de análise. O seu retrato dos tempos atuais traz características um tanto desoladoras para os que acreditam viver em um sistema livre, quando, na realidade, são constantemente conduzidos por ele. O jornalista Carles Geli, em artigo sobre o filósofo, para o jornal espanhol El país, utiliza uma colocação de Han em uma palestra para o Centro de Cultura de Barcelona que auxilia na compreensão de sua crítica: “No livro de George Orwell, a sociedade tinha consciência que estava sob a dominação do ‘Grande Irmão’; atualmente ela não tem mais esta clareza”. Para o pensador, os indivíduos receiam o diferente, realizando uma auto-exploração de si mesmos, que os fazem viver em uma bolha, esta, por sua vez, estabelecida e controlada pelo sistema.
Com estas e outras fontes da internet vamos elaborar uma curta biografia do pensador e apresentar algumas de suas ideias. Esta figura que, até recentemente, recusava-se a dar entrevistas de rádio e televisão e raramente divulgava ao público qualquer informação biográfica ou pessoal, incluindo até sua data de nascimento.
O acadêmico, nascido em Seul, em 1959, estudou metalurgia na Coreia antes de se mudar para a Alemanha na década de 1980 para estudar Filosofia, Literatura Alemã e Teologia Católica em Freiburg im Breisgau e Munique. Completou o seu doutorado em 1994, em que dissertou sobre o também filósofo Martin Heidegger. Ingressou em 2000, no Departamento de Filosofia da Universidade de Basel, e, em 2010, tornou-se membro do corpo docente da Universidade de Artes e Design de Karlsruhe.

Suas áreas de estudo abrangiam as mais diferentes temáticas: filosofia dos séculos XVIII, XIX e XX, ética, filosofia social, fenomenologia, teoria cultural, estética, religião, teoria da mídia e filosofia intercultural. Desde 2012 leciona filosofia e estudos culturais na Universität der Künste Berlin (UdK), onde dirige o recém-criado programa de estudos gerais do Studium Generale. Autor de dezesseis livros, dos quais os mais recentes abordam o que ele chama de “sociedade do cansaço”, uma “sociedade da transparência” e seu conceito neologista de shanzai (palavra derivada do termo neologismo: um fenômeno linguístico que consiste na criação de uma palavra ou expressão nova, ou na atribuição de um novo sentido a um vocábulo já existente), que procura identificar modos de desconstrução nas práticas contemporâneas do processo econômico que ocorre atualmente na China.
Han atualmente direciona seus estudos sobre a transparência como uma norma cultural criada pelas forças do mercado neoliberal. Para ele, os ditames da transparência impõem um sistema totalitário de abertura em detrimento de outros valores sociais, como vergonha, sigilo e confiança. É como se fôssemos sutilmente levados a abrir o livro íntimo de nossas vidas e o resultado é apenas como sociedade que sobrevive em uma paisagem patológica de desordens neuronais tais como a depressão, hiperatividade, déficit da atenção, personalidade limítrofe e o burnout (síndrome do esgotamento físico e mental que está intimamente ligada à vida profissional).
Em uma análise esclarecedora dos personagens do filme “Melancolia” (2011), de Lars von Trier, ele exemplifica com a imagem de uma sociedade cada vez mais dominada pelo narcisismo e pela auto-referência, acarretando na perda do desejo, o desaparecimento da capacidade de se dedicar ao “outro”, ao estranho, ao não-eu. As pessoas passam a girar em torno de si mesmas, cravadas em seus próprios mundos, incapazes de construir relacionamentos. Este processo influencia também na forma como o amor e a sexualidade são permeados por essa mudança social: o sexo e a pornografia, a exibição e a apresentação acabam deslocando o amor, o erotismo e o desejo dos olhos do público.
Em Topologie der Gewalt (Topologia da Violência), Byung-Chul Han continua sua alarmante análise de uma sociedade à beira do colapso que ele iniciou com a “Müdigkeitsgesellschaft” (Sociedade do Cansaço). Nesta obra, ele relaciona violência e individualidade e mostra que a primeira teve apenas sua aparência modificada, transformado o seu “mecanismo de operação” que se dá, nos dias de hoje, sutilmente. A forma marcial da violência dá lugar a uma situação sistêmica mais anônima ao se fundir com a sua antagonista – a liberdade.

Através de Sigmund Freud, Walter Benjamin, Carl Schmitt, Richard Sennett, René Girard, Giorgio Agamben, Deleuze / Guattari, Michel Foucault, Michel Serres, Pierre Bourdieu e Martin Heidegger, Han desenvolve seu próprio conceito de violência. Em outras palavras, os indivíduos são impulsionados pela única exigência de perseverar e não fracassar, bem como pela ambição de eficiência, e acabam por comprometer e sacrificar a si mesmo, em um ciclo vicioso demarcado de auto-exploração e colapso.
As redes sociais são a prova deste individualismo e narcisismo exacerbado que faz as pessoas auto-aprisionarem-se em suas bolhas digitais. Conforme Carles Geli, o filósofo afirma: “Sem a presença do outro, a comunicação degenera em um intercâmbio de informação: as relações são substituídas pelas conexões, e assim só se conecta com o igual; a comunicação digital é somente visual, perdemos todos os sentidos; vivemos uma fase em que a comunicação está debilitada como nunca: a comunicação global e dos likes só tolera os mais iguais; o igual não dói!”. Não é à toa que a intolerância novamente ao que não faz parte do “meu grupo” é descrita como uma marca social do século XXI. Trata-se da ditadura do “Eu”, que só poderá ser desmantelada com uma mudança de códigos de valores em que o individuo perceba a importância do outro para a sua existência, o que implica romper as barreiras do ego e o ser capaz de viver em comunidade.
Fonte: Texto originalmente publicado no site do Koreapost
Link direto: https://www.koreapost.com.br/destaques/trajetoria-de-byung-chul-han-e-sua-descricao-colapso-social-coreanos-pelo-mundo/
Espetacular! Tenho acompanhado o trabalho dele e não deixa de surpreender o quanto estamos enredados…. Ótimo texto!