
O iate “Sibir” chegou em terras brasileiras no dia 6 de dezembro de 2019 ao ancorar em Salvador. Era a primeira vez que o capitão Sergei Sherbakov e sua tripulação pisavam no Brasil. Em um número de seis navegadores, todos provenientes da cidade de Omsk, na Sibéria, à bordo de um iate movido à vela e motor, o “Sibir”, eles saíram de sua cidade natal, localizada no meio do território continental russo, passaram por rios e baías, que medem entre 4.000 quilômetros para chegar ao Oceano Ártico. Depois percorreram o Mar de Kara, velejaram posteriormente pelo Mar do Norte, entrando em São Petersburgo através do Canal Mar Branco-Báltico.

Da segunda maior cidade russa partiram para a Europa, África, América do Norte e, agora, chegaram no Brasil, o primeiro país sul-americano que visitam. Em especial, o “Sibir” tem a missão de celebrar o Descobrimento da Antártica, que em 28 de janeiro de 2020 completará 200 anos. Este fato histórico deu-se através da segunda expedição imperial russa, comandada pelo almirante russo Fabian Gottlieb Thaddeus von Bellingshausen, oficial da Marinha Imperial da Rússia. Nesta ocasião, também se encontrava o almirante Mihail Petrovitch Lazarev, navegador e explorador russo.
A bordo de dois veleiros “Vostok” e “Mirniy“, a missão destes dois oficiais era circum-navegar o Globo, o que levou a avistarem pela primeira vez o continente Antártico. Eles partiram da cidade russa de Kronstadt, na ilha de Kotlin, golfo da Finlândia, a cerca de 30 quilômetros a oeste de São Petersburgo, em 4 de julho de 1819, chegando em 2 de novembro do mesmo ano no Rio de Janeiro. Da capital brasileira direcionaram-se para o sul na ilha Shetland do Sul, onde descobriram a Antártica.


Com o passar de 200 anos, o capitão Sherbakov enfatiza que o mundo esqueceu que a Rússia abriu caminho para o mundo conhecer a Antártica. Atualmente 29 países tem bases científicas no continente, entre eles o Brasil. Em meio a um novo momento que os polos Ártico e Antártico encontram-se novamente no centro da disputa política mundial, Sherbakov salienta: “nós, como verdadeiros patriotas levamos a bandeira russa por onde percorremos, visando preservar a memória e fortalecer o prestígio de nosso país no cenário internacional como uma potência marítima. Contudo, esta meta objetivamos propagá-la com o intuito de promover uma aproximação de nosso país com outros povos, salientando o caráter cooperativo e amistoso da Rússia no desenvolvimento humano”.
Assim, com o apoio do Departamento de Omsk da Organização Russa “Sociedade Geográfica Russa”, da Fundação dos Subsídios Presidenciais, da Instituição Autônoma da Região de Omsk “Clube Náutico de Omsk”, da Organização Pública Regional “A Confederação do Esporte de Vela Russo” e o Fundo de Apoio do Esporte “As Expedições de Velas Siberianas” foi criada a expedição “Sibéria-Antártica-Sibéria”, que engloba também o Projeto Internacional “O Poder da Rússia vai crescer pelos territórios Ártico e Antártico”. Trata-se de uma iniciativa que congrega atividades culturais, esportivas, científicas, que visa preservar a memória histórica e também diplomática, com o claro objetivo maior de promover o chamado “Soft Power” da Rússia.
Desta forma, o capitão Sherbakov explica que após a expedição outros projetos estão previstos em seu cronograma como a organização de uma corrida esportiva entre equipes de iates à vela que devem completar uma volta ao mundo. “Uns devem partir do hemisfério sul e outros do hemisfério norte, quem chegar primeiro será contemplado com um ótimo prêmio”, explica o comandante. Além disso, com o grande número de informações que foram coletados durante a expedição, a organização de um documentário e de um livro também estão nos planos desta tripulação.
Aleksei Dekelbaum, jornalista, membro da União dos Escritores Russos, já fez parte de outras expedições. Ele que ainda é ganhador do Prêmio do Governo de Omsk por mérito no desenvolvimento da cultura e da arte, e autor do livro “Na Capa do Globo”, onde narra a expedição Cuba-Omsk, em que esteve presente, comentou sobre seu trabalho e sua experiência em tais viagens. “Estar no mar é um teste de força. Ao fim de cada jornada podemos definir os heróis da expedição. Para documentar todo o processo temos um site, Facebook, Instagram, VKontakte e OdnoKlassniki (estas últimas são redes sociais russas) e eu vou escrevendo e publicando nestes canais, além de enviar informações para outros veículos de comunicação. Temos ainda pessoas especializadas realizando filmagens e documentando em imagens que estamos publicando no canal YouTube da expedição. Talvez com todo este material seja possível realizar um projeto de um longa documentário no futuro”.

Ao chegar ao Brasil, os navegadores receberam a ajuda do empresário, engenheiro, escritor e navegador Aleksei Belov, dono da Engenharia Belov Ltda. Belov nasceu em Merefa, Ucrânia. Chegou aos 6 anos no Brasil, sendo radicado na Bahia. Mais conhecido como Aleixo, ele recebeu o diploma da Marinha do Brasil como reconhecimento de ser o primeiro navegador a dar a volta ao mundo sozinho à bordo do veleiro “Três Marias”, que levava a bandeira brasileira. O navegador já completou quatro expedições e escreveu o livro “A Volta ao Mundo em Solitário”, lançado em 1981 pela Editora Nórdica.
Belov proveu a manutenção do “Sibir” gratuitamente, assim como organizou a estadia da tripulação no Rio de Janeiro. Esta iniciativa comoveu os marinheiros Nikolai Gregorovitch e Evgueni Zabrodin que comentaram sobre o assunto com a Revista Intertelas e ainda explicaram como esta expedição impactou suas vidas até o momento.
“É um sonho que se torna realidade ver a Antártica. Graças a esta expedição, ao capitão e à tripulação consegui atingir este objetivo e ao levar em conta que nossos antepassados estiveram pela primeira vez no continente antártico, torna tudo ainda mais emotivo. E ainda existe um outro fator: ter a chance de conhecer pela primeira vez países como o Brasil e ter contato com uma outra cultura e com pessoas que de coração aberto estão prontas para ajudar. Os brasileiros acolhem com grande calor humano. Nós, em Salvador, tivemos a chance de consertar nosso iate. Tivemos uma grande ajuda voluntária dos locais. Aqui no Rio ocorre o mesmo. É um grande presente estar em contato com pessoas tão amistosas. Isso alegra a alma”, salienta Nikolai Gregorovitvh.

“Eu me juntei a esta expedição em 20 de setembro de 2019, na cidade de Kiel na Alemanha. E esta tem sido uma oportunidade única. Poder ver o mundo com os próprios olhos, estar pela primeira vez em países como o Brasil, pensei nunca poder ter uma chance destas. Neste país descobri que as pessoas são muito bondosas, prontas para ajudar, únicas. E ainda terei a oportunidade de conhecer a Antártica, conhecer pessoas de culturais diferentes, mergulhar nas águas congelantes do continente. Na Rússia temos a tradição ortodoxa de mergulhar três vezes na água congelante. A sensação ao sair da água é de total renovação, talvez seja possível descrever como uma espécie de renascimento. É muito bom para a saúde do organismo, em especial da pele. Então, vários sonhos estão sendo realizados graças a esta expedição”, explica Evgueni Zabrodin.

No dia 28 de dezembro de 2019, a tripulação teve um encontro com a comunidade russa local e os cidadãos brasileiros interessados, na Igreja Ortodoxa Russa de Sta. Mártir Zenaide. Nesta ocasião também estavam presentes o cônsul geral da Federação da Rússia Vladimir Tokmakov e o chefe de protocolo do Consulado Geral da Rússia no Rio de Janeiro Artem Fomin.
O iate “Sibir” é um projeto do capitão Sherapov. Ele que também é diretor da “Omsk Yacht Club“, vice-presidente da Federação de Esporte de Vela de toda a Rússia, presidente da Federação de Apoio ao Esporte “Siberian Sailling Expeditions” e vice-presidente da Subdivisão Regional de Omsk da Sociedade Geográfica Russa, com sua equipe, começou a construir o “Sibir” em 1987, tendo concluído os trabalhos em 1997. Desde então, o iate já percorreu diversas rotas, atravessando a parte ocidental do Mar do Norte, contornando a Escandinávia, chegando a São Petesburgo. Também atravessou 11 dos 13 mares que banham as costas da Rússia: Cáspio, de Azov, Negro, Báltico, Branco, de Barents, de Kara, de Lastev, da Sibéria Oriental, de Tchuktchi e de Bering. A tripulação tem planos futuros de percorrer os mares de Okhotsk e do Japão.
Pelas hidrovias do território russo visitaram mais de 30 divisões federais do país. No programa “Expedições à vela da Sibéria”, o “Sibir” atravessou 100 mil milhas náuticas e visitou águas territoriais de 45 estados. Em todos estes projetos, os objetivos principais foram compartilhar conhecimento, estimular o desenvolvimento e impulsionar a comunicação e aproximação entre os compatriotas russos e entre a Rússia com outras nações. Por isso, nos seus 10 anos de existência o “Sibir” tem colaborado ativamente com a Sociedade Geográfica Russa, realizando estudos científicos e ambientais.
Nesta expedição mundial em específico, com a cooperação da Sociedade Geográfica Russa e o Ministério das Relações Exteriores da Federação da Rússia, almeja-se promover intercâmbios culturais com representantes dos países participantes e as comunidades russas locais, visando impulsionar uma visão positiva da Rússia. Segundo o capitão Sherbakov, após o Brasil, o iate segue para a Argentina e depois, finalmente, chega a Antártica. O retorno à Rússia vai-se dar através do Oceano Pacífico, ao longo da costa das Américas, através do Estreito de Bering e da Rota Marítima do Norte.
A previsão de chegada à cidade de Omsk está programada pera outubro de 2020. Os marinheiros têm um longo percurso pela frente, mas por enquanto permanecerão no Rio até 2 de janeiro de 2020. Nesta segunda-feira, 30 de dezembro de 2019, o “Sibir” estará aberto à visitação do público de 10h às 17h, no Iate Clube do Rio de Janeiro (Av. Pasteur, 333, Urca, RJ). Em entrevista para a agência de notícias Sputnik Brasil, o capitão Sherbakov definiu o caráter filosófico da jornada de sua tripulação: “aqui no Brasil temos muitos amigos. Os oceanos não devem separar as pessoas, mas uni-las. Nós os atravessamos para encontrá-las”.
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