
Jin Xing, nascida em 13 de agosto de 1967, em Shenyang, Liaoning, é bailarina de dança moderna, coreógrafa, atriz, fundadora e diretora artística da companhia de dança contemporânea Shanghai Jin Xing Dance Theatre. Trata-se ainda da única pessoa pública abertamente transgênero na China continental. Foi uma das primeiras a ter sua cirurgia de troca de sexo autorizada e sua sexualidade reconhecida pelo governo. Sempre muito decidida e mesmo em momentos de grande dúvida, Jin Xing mostra uma personalidade bastante forte, em especial de quem por anos buscou compreender a si mesma, encontrando as respostas e aceitando sua natureza, sem se preocupar com o olhar conservador milenar que ainda impera na sociedade chinesa.
A história de Jin está em parte vinculada a uma história bastante marcante da população chinesa, porém, talvez ainda pouco conhecida no Brasil. A China possui a maior comunidade de coreanos residentes fora da Coreia. São milhões de descendentes de imigrantes que possuem cidadania chinesa, assim como grupos menores de expatriados sul e norte-coreanos. Em 2009, segundo números publicados pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros e Comércio da Coreia do Sul, este grupo tinha um total de aproximadamente 2,3 milhões de pessoas.

Porém, nos últimos anos um grande movimento emigratório para a península coreana acabou modificando esta situação. A população numerosa de coreanos ainda permanece sendo a maior, mas já não possui características tão coreanas, em especial com os esforços do governo central chinês para integrá-los a sua cultura. Contudo, também existem movimentos sociais e culturais naturais que fazem daqueles descendentes de qualquer grupo nacional ou étnico no mundo a querer integrarem-se totalmente a história e a sociedade em que nasceram e cresceram. E na sociedade chinesa atual muitos nomes de descendentes coreanos passaram a compor e serem representantes do país, apesar de sua linha sanguínea.
Diferentemente de outras figuras, Jin Xing não escolheu viver fora da China e ainda, mesmo sendo filha de coreanos, outra cultura bastante conservadora, assumiu a sua nacionalidade chinesa integralmente, sem a necessidade de voltar-se para os antepassados. Jin também estudou em uma escola primária coreana local.
Durante seus estudos, foi muito elogiada pela inteligência, ganhando muitas competições de Ábacos, conforme informa o documentário “Colonel Jin Xing: A Unique Destiny”, dirigido por Sylvie Levey e outros. Naquele tempo, já expressava alto entusiasmo com a dança. Aos 9 anos, ainda como menino, integrou o Exército Popular de Libertação, onde recebeu treinamento militar e participou da companhia de dança do exército, afiliada ao distrito militar de Shenyang.
A dança foi muito utilizada por décadas como forma de propaganda da instituição e nela, a futura bailarina encontraria as bases e as descobertas que mudariam o rumo de sua vida para sempre. Ao se graduar, em 1984, aos 12 anos, ela alcançou o posto de coronel. Mais tarde, ela ganhou o concurso de dança nacional com uma peça de dança étnica da Ásia Central.
Conforme as palavras da própria bailarina, ser bem-sucedida na sua profissão seria sua meta principal, no intuito de alcançar maior aceitação na China, permitindo com que pudesse desfrutar de uma vida pessoal mais livre e plena. Assim, ela decidiu ir para o exterior e, em 1987, foi para Nova York estudar dança moderna por quatro anos. Posteriormente, viajou e apresentou-se na Europa, tendo inclusive ensinado dança em Roma de 1991 a 1993. Retornou à China aos 26 anos. Em 1995, passou por sua cirurgia de redesignação de gênero. Em 2000, mudou-se de Pequim para Xangai e abriu sua companhia de dança. Aos 33 anos, adotou o primeiro filho e depois outros dois ampliariam a família. Em 2005, conheceu o ex-marido e hoje companheiro alemão Heinz Gerd Oidtmann, que vive com ela em Xangai.

Em 2013, ela integrou o júri da primeira temporada chinesa de “So You Think You Can Dance”. A sinceridade e carisma de Jin caiu na simpatia do público, em especial quando ela fez questão de criticar a postura do programa, ao possibilitar o apresentador usar da lesão de um concorrente para criar uma história triste e melhorar os índices de audiência. Em um artigo para o jornalista Matt Sheehan, do HuffPost US, ela disse: “a TV chinesa sempre escava as cicatrizes das pessoas, consome sua dor. Essa é a maior fraqueza da TV chinesa e eu odeio isso! Espero que não precisar usar a dor das pessoas e o seu sofrimento”. Com esta participação, ela acabou tendo o seu próprio programa, o “The Jin Xing Show”, exibido pela Dragon TV entre 2015 e 2017, chegando a atingir audiências de 100 milhões de espectadores por semana. Em 2016, ela participou do “Chinese Dating”, onde os pais buscam uma futura esposa para seus filhos.

O programa tem sido criticado por retratar uma visão conservadora sobre o casamento e o papel das mulheres na família. Fluente em mandarim, inglês, coreano, italiano e francês, a bailarina ainda participou de produções cinematográficas como o filme coreano “Resurrection of the Little Match Girl” (2002), dirigido por Jang Sun-woo. Em 2005, ela apareceu no filme tailandês “Tom-Yum-Goong”, dirigido por Prachya Pinkaew como a vilã Madame Rose. Seu trabalho na dança é considerado “surpreendentemente originais e provocativos”, tratando de temas polêmicos.
Apesar de uma vida bem-sucedida em todos os sentidos, Jin Xing sabe dos desafios que ainda enfrenta. Em entrevista para o jornal inglês “The Guardian”, ela afirmou: “em todo o mundo, é muito difícil para as pessoas aceitarem isso. Os homossexuais, na China, são como uma pequena ilha. Transgêneros [as pessoas] têm ainda menor espaço e aceitação. Contudo, eu odeio choramingar. Acredito que se você quer fazer algo, então faça e sem reclamar, caso contrário trata-se de uma vida patética.” Jin sempre salienta que diferentemente do que muitos pensam, ela nunca se considerou homossexual.
Em entrevista para Abid Rahman do Hollywood Reporter, ela contou o assédio que sofreu quando ainda pertencia e era destaque do grupo de dança do exército: “uma vez um dos oficiais militares, que era homossexual, tentou me assediar. Eu disse a ele: ‘por favor, não faça isso! Você é gay, tudo bem! Não tenho nada contra homossexuais, mas não sou um. Não me assedie. Escolha outra pessoa. Contudo, por um tempo esta dúvida persistiu e eu fui aos bares gays, conheci um amigo gay, mas descobri que não fazia parte deste grupo. Minha sexualidade ainda é como a de uma mulher. Foi quando descobri as palavras – transexual, transgênero. Eu disse: ‘OK, eu pertenço a essa pequena ilha’. Então comecei a pesquisar”.
Segundo Rahman, ao contrário do que se possa pensar, Jin não quer ser considerada como uma líder que abre caminho para outros, não gosta nem de abrir qualquer discussão sobre a comunidade transgênero no mundo. Nesta entrevista, ela afirmou: “sou muito individualista. Os jovens olham para mim e me chamam de Estátua da Liberdade da China. Talvez eu seja a pessoa que desafiou vários limites, mas não quero ser bloqueada, ou limitada na minha estrada! É isso.”
Fonte: Texto originalmente publicado no site do Koreapost
Link direto: http://bit.ly/koreapost-jinxing-bailarinatransgenero-china
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